Inesperado, emocionante e muito bem
jogado, vencido brilhantemente pela Espanha, o Eurobasket 2022 vai ficar na
história da modalidade.
Servia, Grécia e Eslovénia, que eram as
principais favoritas para o ouro, cedo ficaram pelo caminho.
As “estrelas“ NBA : Giannis Antetokounmpo, Nikola Jokic e
Luka Doncic, três dos melhores jogadores do mundo, saíram pela porta
pequena da competição continental. Nenhum deles lutou pelas medalhas, pese o
facto de liderarem três das seleções favoritas. Um
fracasso rotundo para as equipas e para os jogadores.
Se
serve para a NBA, também serve para a FIBA
Sergio Scariolo, o
italiano que levou a Espanha à conquista do Eurobasket 2022, é um mestre da
tática. Mais uma vez, conseguiu implantar uma filosofia defensiva, que tinha
por base as defesas alternadas, a que somava um ataque coletivo.
Sergio foi adjunto de
Nick Nurse nos Toronto Raptors da NBA e foi o responsável pelo uso das defesas
zonais e mistas nessa liga, o que raramente acontece.
Agora no Eurobasket,
repetiu as defesas com sucesso.
Curiosamente, na
antiga liga profissional portuguesa de basquetebol, dos anos 90 do século
passado, muitos treinadores, e eu particularmente, usávamos estas defesas.
Agora, nesta
fantástica final europeia, os mesmos argumentos táticos defensivos voltaram a
surgir.
As regras permitem o
uso de qualquer tipo de defesa, contrariando os treinadores “fundamentalistas”
da defesa individual.
Obviamente para se
conseguir utilizar defesas múltiplas, as equipas devem dominar a defesa
individual, será impossível e desaconselhável o uso das primeiras sem dominar a
defesa individual.
A atitude da equipa, a
vontade de ganhar e a confiança dos jogadores explica mais este milagre dos
espanhóis.
Não podem ficar
quaisquer dúvidas a Espanha é a potência europeia número 1 face aos resultados
obtidos, este ano, em todos os escalões e géneros.
Os
jogadores espanhóis foram sempre agressivos, conseguiram aplicar os fundamentos
da defesa, não só na defesa individual, como em todas as outras defesas zonais
e mistas.
Muito treino
e boas aprendizagens na formação levam a automatismos eficazes.
Vejamos
algumas das situações mais frequentes da equipa espanhola, neste europeu.
Na defesa
do bloqueio
direto lateral muito utilizado na transição ofensiva (“chegar a jogar”)
o defesa do bloqueador defendeu dava a ajuda inicial em “Show “, recuperando
posteriormente na defesa do portador da bola (1).
O defesa
X1 passava por trás e recuperava rapidamente o enquadramento com a bola
enquanto o defesa X4 dava uma segunda ajuda e posteriormente recuperava o
atacante direto (4) – figura 1.
Já na
defesa do bloqueio direto central, o defesa X5 “fazia show” e o defesa X1
passava por cima do bloqueio.
Quando o
ataque tentava o denominado “short roll” a defesa rodava:
O defesa
X4 saia a marcar o atacante 5, enquanto o defesa X3 marcava o atacante 4 e o
defesa X1 saia a cortar a linha de passe com os braços abertos e altos na
marcação ao atacante 3 – figura 2 - (Loaiza, 2022).
O plano da Espanha apontava
para uma defesa muito agressiva, na defesa dos bloqueios diretos, com grande
pressão na bola. Na final, optaram por
dar de “borla”, nas denominadas continuações curtas para o cesto (“Short
roll”), o gigante poste NBA Gobert. O francês evidenciou muitas
carências técnicas, sobretudo na hora de distribuir o jogo – figura 3.
Maus passes, finalizações deficientes,
decisões erradas e tardias na aplicação do conceito ofensivo agora na moda “Short
roll” lexplicam o insucesso dos franceses.
Com os bases muito lentos na tomada da
decisão e com o poste bloqueador Gobert a cortar lento para o cesto, a França
raramente encontrou a técnica e o tempo certo no passe para 5 – figura 4 - (Castillo,2022e).
A
juntar a tudo isso, os postes franceses não acertaram nos lançamentos de meia
distância, o que facilitou as rotações defensivas dos espanhóis, compensando os
desajustes verificados.
Com o base francês a ir buscar a
bola à mão do poste na zona central (figura 5), a ideia era posteriormente
iniciar o ataque com o bloqueio direto.
No movimento inicial, o defesa do portador
da bola passava por trás (figura 6).
A resposta óbvia do ataque passou
naturalmente por novo bloqueio direto. A resposta da defesa foi com troca
defensiva imediata e agressiva. Em situações de bloqueio direto lateral as
respostas foram idênticas (figura 7).
A solução do “trap” ao portador da bola, com a linha de passe óbvia fechada e com os outros dois jogadores a marcarem três atacante e preparados para rodarem, foi também utilizada – última imagem da figura 7 - (Castillo,2022g).
Como já
foi referido, a Espanha foi quase sempre muito agressiva na defesa
dos bloqueios diretos, nomeadamente nas primeiras ajudas.
Com o defesa do bloqueador
a defender em “Flash”, afastaram a bola do cesto,
com as ajudas largas impediram o jogo com passes bombeados (Arrufat, 2022).
O
processo ofensivo
No início do jogo da final, a Espanha recorreu muito ao base Lorenzo Brown, para colocar em marcha o processo ofensivo de Scariolo. A gestão dos bloqueios diretos constituiu um enigma difícil de desvendar pelos oponentes do Eurobasket.
O bloqueio central 51 (figura 8) deu muitos bons
lançamentos exteriores do cotovelo.
No bloqueio direto central 52 (figura 9), o poste
muitas vezes abriu fora (Pop Out 5) para dar continuidade ao ataque. O atacante
4 cortava para o lado oposto abrindo espaço. O ataque era concluído com o
clássico jogo SPR (“side pick and roil”) entre 5 e 1 - (Castillo, 2022d).
Com o bloqueio central, o base 1 ganhou vantagens,
nomeadamente com o recurso a um segundo bloqueio com saída pelo lado oposto –
figura 10.
Com o
defesa 5 a defender as penetrações, o atacante 2 lançava do exterior – figura
11.
Apoiar o
jogo no poste interior dava possibilidades a que este jogasse 1x1 (Castillo, 2022j).
Entrar no
ataque com passe ao poste (figura 12) permitiu a entrega de bola à mão de 4 a 3
e posterior jogo de bloqueio direto central entre 3 e 5 (Garuba e Brizuela) –
figura 13.
Ao abrir no perímetro (“pop out”), Garuba criava um triângulo com o base Díaz para atacar o “close out” (Gómez, 2022).
Os bases Lorenzo Brown e Alberto Díaz, realizaram um extraordinário campeonato conseguindo encontrar muitas vezes o passe certo no tempo certo.
Bloqueia o bloqueador acção entre postes (4 e 5)
– figura 14.
Devolução do passe ao base
e isolamento de 4 (corte nas costas) – figura 15 - (Castillo, 2022j, 2022c).
Jaime
Fernández não jogou muito bem nos encontros iniciais, mas na final, esteve a
bom nível, assumindo lançamentos importantes e esteve a bom plano na defesa,
com um nível de atividade de mãos e
contacto físico tremendo.
Entrada ataque em SPR (bloqueio
lateral) seguido de bola à mão (“Hand off”) – figura 16.
Entrada ataque em SPR (bloqueio
lateral) com passe para o lado oposto e novo SPR (52) – figura 17. Aclarado de
4 para dar mais espaço para a equipa jogar 2x2. Possível saída pelo lado contrário
bloqueio de 2.
Bloqueio central direto
(52). Atacante 2 assiste 5 para “short roll” (Castillo, 2022h).
O veterano Rudy Fernadez continua a ser produtivo, em cada segundo de utilização, para a sua equipa. Trabalhou muito bem sem bola no ataque, não deixando de tomar iniciativas. Na defesa, usou como habitualmente as mãos roubando bolas importantes.
Bloqueio indireto de 1 para 2 e ida à
mão, jogo central de 2x2. Manobra de diversão (figura 19).
Bloqueio indireto para libertar lançador
(3) – figura 20 - (Castillo,2022f).
Quando a França colocou em
campo a dupla interior Poirier-Fall e defendeu à zona, a Espanha respondeu com
Juancho-Garuba e com o recurso à circulação rápida da bola e ao uso
dos espaços intermédios entre defesas, procurando os postes, no final da posse
de bola. Com Juancho a marcar muitos cestos, conseguiu destruir a pesada defesa
contrária – figura 21.
Movimento constante da
bola e dos jogadores, procurando no final os postes (4 e 5) – figura 22 - (Castillo, 2022a; Perez, 2022).
A dupla, Lorenzo Brown e Alberto Díaz, comandou uma orquestra afinada.
Bloqueio central e “pop out” seguido de
bloqueio indireto 51 e lançamento exterior (figura 23).
Penetrar e assistir para lançamento
exterior, foi também utilizado – figuras 24 e 25 - (Castillo,2022c).
O clássico ataque “Horns / Flare” também foi usado pela Espanha. Saída de 4 para lançamento exterior – figura 26 - (Castillo,2022l).
A surpresa nas situações especiais
Ao sair do desconto tempo
(“ATO”), a Espanha recorreu muitas vezes defesas zona 2/3 e 3/2, ambas com
ajustes.
Ajustando as posições, os
defesas acompanhavam os cortes.
Com a bola no canto, a
defesa inicial passava a 2.3 – figura 29 - (Castillo, 2022k).
Na defesa da Bola linha lateral, a Espanha
defendeu algumas vezes zona ajustada 2.3, 3.2 e em “box and one”, surpreendendo
os adversários (Castillo,2022i) – figura 30.
Bola linha lateral (“SLOB”)
Saída “Zeeper”, mudança do lado da bola.
Bloqueio cego e bola à mão – figura 31.
Nova mudança do lado da bola com
bloqueio indireto de 4 para 3 que lançava – figura 32 - (Castillo,2022m).
Jogar
a correr, quando é possível
Com alguns problemas no
ataque de posição, na final, Scariolo reajustou o ataque, conseguindo a partir
da defesa zonal 3.2 sair rápido para o contra-ataque e marcar pontos (figura
33).
Saída
rápida para o contra-ataque com passe em diagonal e lançamento antes da defesa
estar ajustada (figura 33). Papel
importante tiveram os bases. Algumas vezes jogavam costa a costa para jogarem
1x1 ou penetravam assistiam para o canto oposto (Castillo,2022b).
Mensagem Final
A Espanha
é uma clara referência e exemplo de trabalho para todos os
treinadores. Continua a ganhar campeonatos importantes (esteve nas 8 finais nos
escalões de formação), provavelmente pelo esforço e aplicação das suas gentes.
Desde o corpo técnico da Federação até aos mais modestos treinadores da
formação, que nunca param de trabalhar, mesmo sem grandes compensações
financeiras, continuando o ensino e o treino com paixão e dedicação.
Enquanto este país tiver gente apaixonada, trabalhadora e
talentosa em todas as áreas do basquetebol (amador, formação e seleções), as
medalhas e os campeonatos continuarão a cair…
Referências
Arrufat, V. (2022). Scariolo desconacta a Gobert. Retrieved September
18, 2022, from https://twitter.com/i/status/1571619298304561153
Castillo, M. (2022a). Cuando Francia propone a Poirier-Fall,
España presenta a Juancho-Garuba. Retrieved September 19, 2022, from
https://twitter.com/Marc__Castillo/status/1571815893679710208
Castillo, M. (2022b). Después de un mal inicio de 3er cuarto,
pide tiempo muerto Scariolo, que trata de ajustar su atascado ataque. Retrieved
September 19, 2022, from https://twitter.com/i/status/1571815902517264384
Castillo, M. (2022c). El cierre lo orquestó Lorenzo Brown y
lo ejecutó Alberto Díaz, haciendo justicia al extraordinario campeonato que se
ha marcado. Retrieved September 19, 2022, from
https://twitter.com/i/status/1571815908753956865
Castillo, M. (2022d). En el inicio de partido, España se
apoya en Lorenzo Brown para poner en marcha la maquinaria ofensiva. Retrieved
September 19, 2022, from
https://twitter.com/Marc__Castillo/status/1571815881575104512
Castillo, M. (2022e). En el plano defensivo, España optó por
ser muy agresiva en la defensa del bloqueo directo sobre el balón, liberando
las continuaciones cortas de Gobert. Retrieved September 19, 2022, from
https://twitter.com/Marc__Castillo/status/1571815883961401344
Castillo, M. (2022f). En labores de intendencia, otro gran
día para Rudy. Retrieved September 19, 2022, from
https://twitter.com/i/status/1571815888856449025
Castillo, M. (2022g). La inoperancia de los 5s franceses en
la media distancia, permitió que España pudiese recoger las caídas tras el
directo muy abajo. Retrieved September 19, 2022, from
https://twitter.com/i/status/1571815891263782913
Castillo, M. (2022h). No habían sido las dos mejores semanas
para Jaime Fernández, pero ayer estuvo finísimo. Retrieved September 19, 2022,
from https://twitter.com/i/status/1571815886473797633
Castillo, M. (2022i). Sobre el saque de banda, un poco de
caja + 1, para que no se diga que no hay variedad. Retrieved September 19,
2022, from https://twitter.com/i/status/1571815898561773568
Castillo, M. (2022j). Sobre esa salida, España vuelve a coger
impulso, cerrando su aro atrás y proyectándose en ataque con mucha precisión
para explotar sus ventajas. Retrieved September 19, 2022, from
https://twitter.com/i/status/1571815904572317696
Castillo, M. (2022k). Sobre esa salida de tiempo muerto, en
las siguientes defensas España alterna su zona 2-3 y la 3-2, ambas de ajustes.
Retrieved September 19, 2022, from
https://twitter.com/i/status/1571815896133545989
Castillo, M. (2022l). Spain: horns flare. Retrieved September
19, 2022, from https://twitter.com/i/status/1571815912470368256
Castillo, M. (2022m). Spain: SLOB. Retrieved September 19,
2022, from https://twitter.com/i/status/1571815914294714369
Gómez, C. (2022). Tras el Mano a mano Pradilla ocupa Short
corner LD. Situación de BD “L” entre Garuba y Brizuela. El pop de Garuba genera
un triángulo con Díaz. Atacando el close-out, el defensor da la espalda contra
la salida cruzada, espacio con el step back para la ven. Retrieved September
19, 2022, from https://twitter.com/i/status/1571860131624673281
Loaiza, G. (2022). Defensa agresivas - Last, segunda ayuda +
seguir trabajando (no pararse). Retrieved September 19, 2022, from
https://twitter.com/gaboloaizaperez/status/1571786926385876992
Perez, G. L. (2022). ATAQUE VS ZONA: el uso de los espacios
intermedios para generar dudas en la defensa. Retrieved September 20, 2022,
from https://www.facebook.com/gabriel.loaizaperez.9/videos/1103200393735063
por Mário Silva
25-09-2022
#basquetebol #basketball #ideiasparaobasquetebol #baquetebolqueconta #juntosvamosmaislonge #basquetebolasuamedia #basquetebol5estrelas #basquetebolcomideias