Qual é a melhor "tática"? - por João Oliveira (*)

QUAL É A MELHOR “TÁTICA”?
Quando pensamos no jogo de basquetebol, no caso, no ataque, podemos interrogar sobre - qual é a melhor "tática", para o ataque ser bem-sucedido?

Quando comecei a treinar, tinha a seguinte questão em mente: COMO COORDENAR AS AÇÕES DOS JOGADORES?
Esta questão resultava de uma necessidade - a de organizar o caos do jogo anárquico. Por isso, fui à procura de uma "tática", que organizasse o caos do jogo anárquico. Tinha 19 anos e estava a treinar uma equipa de seniores femininos. Já lá vão mais de 30 anos.



O QUE FIZ PARA SATISFAZER ESTA NECESSIDADE?
Resolvi este desafio recorrendo ao que me era familiar e conhecido. Utilizei a "tática" Flex, para organizar o caos do "ataque" anárquico, mas esta solução era em si mesma uma grande ironia. Isto porque, enquanto jogador, concordava com o Flex? Não. Desde cedo e enquanto jogador, reagia a todos os sistemas que limitavam a minha autonomia. Porém e mesmo indo contra algo importante para mim - não limitar autonomia dos jogadores - ironicamente, esta foi a primeira "tática" que utilizei, para organizar o ataque, como Treinador.

POR QUE RAZÃO COMECEI A FAZER, COMO TREINADOR, O QUE ME INCOMODAVA, COMO JOGADOR?

Porque havia outra coisa ainda mais importante do que a autonomia dos jogadores, a ORGANIZAÇÃO das ações individuais e coletivas. Por isso, como não sabia gerir a liberdade dos jogadores de forma organizada e, muito menos, conseguia “casar” ambas (a liberdade dos jogadores e organização da equipa), a organização, através do Flex, prevaleceu. Ou seja, a razão em causa foi o desconhecimento de uma "tática" que simultaneamente organizasse as ações coletivas e valorizasse a autonomia individual.
Contudo, esta ironia, esta incoerência, levava-me a sentir uma tensão entre o que acreditava (na autonomia, na liberdade dos jogadores) e o que realmente estava a fazer (coordenar as movimentações dos jogadores limitando a sua liberdade). Por isso e com o tempo, dois paradoxos tornaram-se evidentes. Quais?

Paradoxo 1 - Queria que as pessoas que jogam pudessem ter liberdade e capacidade de escolha, mas como não sabia como fazer isso acontecer, ao mesmo tempo que “oferecesse” uma organização à equipa e acabei por fazer algo que não queria, limitar a liberdade de escolha.
Estávamos na era dos 30'' segundos de ataque e passava “horas” a treinar 5x0, para os jogadores memorizarem os movimentos, a mudar o lado da bola, a (…), na esperança de que a organização estruturada conduzisse a um ataque bem-sucedido.

Foi isso que aconteceu?
Na prática, quando chegava aos jogos, os erros e as falhas eram muitos e, portanto, eram mais as posses de bola perdidas do que as lançadas, quanto mais as convertidas. Durante o jogo, dava por mim a “treinar” na linha lateral, tantos eram os problemas. Depois dos jogos, refletia sobre ele. O que se tinha passado? O que tínhamos feito de positivo? O que havia a melhorar? Refleti e percebi que o que corrigia no jogo nada tinha a ver com o que treinava. Os erros tinham mais a ver com coisas simples, como fintar antes de passar, passar para longe do defensor, atacar a receção, proteger o drible, (...), do que com a "tática Flex".

Paradoxo 2 – Queria que a equipa fosse bem-sucedida no ataque, mas ao investir na coordenação coletiva acéfala (as jogadas), descurava as coisas que podiam aumentar as tentativas de lançamento (passe e drible) e a realização do objetivo do jogo da bola no cesto (lançamento). Acabava por colher o que não queria: não era bem-sucedido.
As circunstâncias (treinar clubes mais "modestos" em meios e grandes em pessoas) e os resultados (derrotas), fizeram-me mudar a forma de treinar.
Nos treinos, comecei a introduzir exercícios, para melhorar os detalhes que corrigia durante o jogo, na linha lateral. Com o tempo, com treino, com mais treino e com muita persistência e paciência, o número de "turn-overs" foi diminuindo e começamos a lançar mais vezes.
A melhoria do passe-receção e do drible em situações de treino semelhantes ao jogo, tinham: (a) baixado os "turn-overs", (b) levado a que dirigisse mais o jogo do que a treinar durante o jogo, e (c) aumentado o número de lançamentos. Mas, os pontos marcados não tinham aumentado significativamente.
Para a equipa ser bem-sucedida no ataque, tinha um outro problema para resolver: passar de atirar a marcar, a "meter" a bola no cesto.
Começámos a destacar o treino do lançamento. Naquele tempo, os meus treinos incluíam o treino do lançamento na passada, do lançamento exterior e dos lances livres. Por exemplo, quanto ao lançamento na passada, passei por um período de enriquecimento do lançamento, ao ponto de ter descoberto mais de 30 maneiras de fazer lançamento na passada. Melhorei muitas “coisas simples”, uma delas o detalhe da pega da bola para lançar e confirmei o seu enorme impacto no lançamento. Consequentemente, as percentagens de lançamento foram subindo, os resultados melhorando e passamos a ganhar mais vezes do que as que perdíamos.
Hoje e com algum distanciamento, percebo que esta fase foi um momento riquíssimo de aprendizagens, que não teriam sido possíveis se, provavelmente, tivesse começado a treinar os "barcelonas". As derrotas “forçaram-me” a procurar novas e diferentes soluções.

QUAL É A MELHOR "TÁTICA"?
No curso de Educação Física, comecei a tentar resolver o primeiro paradoxo (querer a autonomia dos jogadores e fazer "jogadas" que a limitava). Por isso, comecei à procura de uma forma de organização da coordenação das ações dos jogadores que utilizasse e potenciasse a sua liberdade e capacidade de escolha. Apercebi-me que quer os Jogos Desportivos Coletivos, quer em cada uma das modalidades estavam a evoluir para um novo paradigma, que poderá ter iniciado nos anos 60 (neste momento, estava no final dos anos 80 e princípios dos anos 90).

Procurava a melhor “tática”, mas como se processava a "tática"? O que necessitava o jogador para jogar?

Recentemente dois colegas abordaram a questão da tática (Carmo, 2020; Silva, 2021). Recuando no tempo, tudo começou a fazer sentido, quando conheci a obra de Frederich Mahlo sobre o ato “tático” em jogo. Segundo Mahlo (1969), o ato tático engloba três momentos/necessidades
  1. Perceção e análise da situação, 
  2. A tomada de decisão e 
  3. A execução.

1º MOMENTO / NECESSIDADE - PERCEÇÃO E ANÁLISE DA SITUAÇÃO

Ao jogar, os jogadores necessitam de PERCECIONAR E ANALISAR. Por isso, começámos a treinar “o que olhar e ver”, em cada situação. Contudo, confrontámo-nos com mais um desafio. Sim porque se os jogadores tivessem de percecionar e analisar nove pessoas em movimento para decidir, não conseguiriam decidir em tempo útil, no jogo, dada a quantidade de informação a processar e o ritmo da mudança. Mas, se fosse capaz de reduzir essa informação, apenas ao essencial e ensinasse os jogadores a percecionar e analisar o relevante em cada situação, então diminuiria substancialmente o tempo de análise e as pessoas que jogam poderiam decidir em tempo útil.
Imaginei-me a chegar a três cidades, de helicóptero, a cidade A, a cidade B e a cidade C. Se não soubesse onde estava, ao ver as três imagens seguintes e sabendo que no mundo há milhares de cidades, será que conseguiria descobrir quais são as três cidades, das imagens que se seguem?

Cidade A
Cidade B
Cidade C

Sim, conseguia. A cidades A, B e C eram respetivamente New York, Paris e Sydney. Ao refletir sobre o como teria conseguido identificar estas 3 cidades, entre mais de 35.000 cidades possíveis, pensaria: O que me ajudou a fazer essas escolhas? 

Construindo a partir do modelo já referido (o do ato tático em jogo), podemos dizer que: percecionamos e analisamos a informação contida nas imagens e, ao fazê-lo, reconhecemos informação ou sinais pertinentes ou relevantes, respetivamente o Empire State Building, a Torre Eiffel e a Ópera de Sydney, que nos revelaram a que cidades pertenciam aquelas imagens.

Pois bem, a jogar, os jogadores também podem escolher entre muitas opções, mas NÃO necessitam de olhar para todos os "edifícios" (jogadores adversários e colegas de equipa) para decidir em tempo útil. Os jogadores necessitam de conhecer e reconhecer os “Empire State Buildings”, as "Torres Eiffels", as "Óperas de Sydney" (detetar os sinais essenciais e reveladores para decidir bem) e que tornam possível a escolha atempada, num contexto complexo e em constante mudança.
Assim, ensinar a jogar exige ensinar “o que olhar e ver” a cada momento e treinar essa perceção e análise sistematicamente, para decidir bem.

2º MOMENTO / NECESSIDADE - A TOMADA DE DECISÃO

Ao jogar, os jogadores necessitam TOMAR DECISÕES, num contexto em que a mudança e a imprevisibilidade são uma constante e os treinadores necessitam de ajudar os jogadores nesse processo, a minha "tática" para resolver este problema foi o Flex.
O Flex resolvia o caos, tornava o jogo constante, previsível, mas também descapitalizava o ataque, porque reduzia a imprevisibilidade e a capacidade de adaptação. Por isso, as equipas adversárias, podiam antecipar as nossas "manobras". Isso mesmo aconteceu nos momentos das decisões, onde os jogos eram mais equilibrados, as equipas adversárias faziam “scouting” e se ajustavam defensivamente, na parte mais avançada e decisiva da época. Este era e é um dos problemas dos "set plays": limitar a liberdade e capacidade de escolha dos jogadores a uma opção que organizava o caos, mas desperdiça todo o potencial das pessoas tomarem as melhores decisões e resolverem os ajustamentos do “scouting”. Por outro lado, jogar em "freelance" capitalizava a imprevisibilidade, mas desperdiçava a intencionalidade do trabalho coletivo.

Paradoxo 3 – Queria que a equipa fosse bem-sucedida no ataque, mas ao organizar as ações ofensivas através de uma estrutura constante e previsível, não só limitava a iniciativa e capacidade de adaptação dos jogadores, como semeava a dependência dos jogadores no treinador e facilitava o ajustamento das defesas adversárias. Por isso e afinal, a solução encontrada comprometia o desejado sucesso no ataque, nomeadamente em momentos decisivos da época.

QUAL ERA A SOLUÇÃO?
Como poderia organizar as ações dos jogadores, ao mesmo tempo que libertava e potenciava a sua capacidade de escolha, com isso melhorar a sua capacidade de adaptação e de resposta às “areias” introduzidas pelo “scouting” e consequentemente, a equipa continuar a ser bem-sucedida, também nas finais e, por isso, vencer as finais?
A importância desta questão é demonstrada por alguns resultados das principais equipas do nosso basquetebol, nas últimas semanas (recordo que este texto foi originalmente escrito a 14-2-2019).
Encontrei no ensino da defesa e das situações de finalização em superioridade numérica a inspiração para começar a transformação. Isto porque, na defesa HxH não ensinava jogadas, mas princípios ou conceitos e o mesmo acontecia nas finalizações de superioridade numérica. Por exemplo, na defesa do jogador com bola, um das "coisas" que ensinava era o conceito "bola-tu-cesto" (BTC) e, nas situações de 2x1, ensinava o conceito "penetra lança ou assiste" (PLA). Os conceitos tinham-me ajudado a organizar a defesa e as situações de finalização em superioridade numérica, então também eles deveriam tornar possível a organização do caos ofensivo do jogo anárquico em igualdade numérica, sem limitar a capacidade de adaptação dos jogadores e da equipa. Por isso, a questão não era se podíamos jogar por conceitos, também no ataque (igualdade numérica), mas que conceitos, princípios ou regras de ação deveria ensinar, em igualdade numérica.
Quando tentava aplicar esta ideia ao 5x5 a confusão era mais do que muita. Por isso e novamente inspirado pela defesa e superioridade numérica, comecei por analisar a situação coletiva mais simples, o 2x0 e constatei que havia 27 possibilidades ou combinações possíveis (Oliveira, 2000)
Quando fazer cada uma delas? Se há mais de 25 combinações possíveis no 2x0, quantas haverá no 5x5? O ataque poderia tornar-se numa enorme confusão.

Como podia capitalizar a imprevisibilidade e o contributo dos jogadores, para confundir o “scouting” e responder eficazmente a ele, sem criar confusão, no ataque?

Descobri que quanto menor o número de elementos a percecionar, mais fácil era decidir e que as boas decisões necessitam de ser reguladas por princípios, conceitos, regras de ação ou critérios de decisão, que apoiassem os jogadores a escolher entre A ou B, em vez de os limitar e à resposta pré-estabelecida, independentemente do contexto.
Então a questão não estava em encontrar o melhor "set play", antes treinar o que ver e analisar e os critérios de decisão. Na minha cabeça, foi assim que nasceu o jogo "por leitura" e que tornei público, uns anos mais tarde (Oliveira, 2002).
O que é que a defesa poderia fazer? O que era necessário ver e analisar, em cada situação e que critério ou conceito podia apoiar os jogadores a tomarem a melhor decisão? Que conceitos tinha aprendido como jogador? Que respostas é que os jogadores davam em treino e no jogo - formal e informal - que faziam sentido, para determinado estímulo defensivo? Não deveria ser o único Treinador com esta preocupação e, por isso, quem é que via o jogo nesta perspetiva e que conceitos é que já tinham sistematizado?
Todas as situações passaram a ser oportunidades, para descobrir conceitos.
Por exemplo, uma vez, estava num Clinic da ANTB, no Pavilhão do Atlântico, a ver uma intervenção de um treinador americano - Bill Whitaker - sobre defesa e, enquanto o Treinador explicava a defesa, um dos “figurantes” (atacantes) tornou-se, para mim, no “protagonista” daquela preleção, ao fazer algo que contrariava o que a defesa estava a fazer e que passou a ser um conceito de ataque. Ainda hoje o utilizo o que vi aquele jogador fazer e, curiosamente, observo-o em algumas equipas de topo, como no Fenerbahce, no último jogo com o Panathinaikos.
Outro dos conceitos surgiu da justaposição de uma ideia que aprendi de George Ravelling (Ravelling, 1992) com um conceito que aprendi com Gérard Bosc (Bosc, 1992), que permitiu reduzir as 27 possibilidades do 2x0 a apenas 3 situações.
Curiosamente, quanto mais aprofundávamos o conhecimento do jogo, nesta perspetiva, mais semelhanças e padrões identificávamos.
Assim ensinar a decidir apoia-se no ensino da perceção, mas vai para além disso, exige o ensino dos conceitos, princípios ou regras de ação.

Nessa altura, para mim, tornou-se claro que:
  • Os Treinadores têm necessidade de organizar as ações da equipa e jogadores. Poderão fazê-lo estruturando ou elaborando. A estrutura organiza a equipa através de “set plays” e oferece segurança, previsibilidade, mas compromete a capacidade de iniciativa e adaptação. A elaboração organiza a equipa utilizando princípios e conceitos que alavancam a iniciativa e a adaptação, mas poderão comprometer a segurança do treinador, se não conhecer os princípios e conceitos de jogo e não treinar a sua capacidade de perceção e análise do jogo;
  • Há uma interdependência entre a "técnica" e a "tática", na medida da "técnica" ser uma das partes do momento da execução do ato tático. Ou seja, da "técnica" ser parte da "tática", por materializar as perceções e as decisões, do ato tático;
  • Qualquer jogador que conheça os conceitos de jogo (que saiba jogar) terá a maior das facilidades em fazer as jogadas, os "set plays". Infelizmente, o contrário não se verifica. Por que será?
  • Estes princípios e conceitos são universais, intemporais, irrefutáveis (autoevidentes) e estão sempre presentes. Tal como com a lei da gravidade, podemos não saber o que é, nem pensar nela, mas a gravidade existe e está sempre presente, também os princípios e os conceitos existem e estão sempre presentes.
Portanto, a questão não era se a equipa necessitava de organização (“tática”), mas a forma como se organizava, sendo que diferentes formas de organização resultam e produzem diferentes consequências.
Ensinar a Jogar (os conceitos atingiram a sua maturidade faz 30 anos) em vez de Ensinar Jogadas ("set plays") é criar a possibilidade de formar quem CRIA E COMPÕE música, em vez de quem a REPETE. 
A este propósito e de forma a reforçar esta ideia, o antigo jogador da Seleção Nacional, do FC Porto e do SL Benfica (entre outras equipas) Aniceto do Carmo fez um valioso testemunho, sobre a possibilidade de se jogar sem "amarras":
"(...) mas jogar basquetebol por conceitos era, e é, outra dimensão" (Carmo, 2021a, p.94)
Numa conversa sobre Basquetebol, o colega Mário Silva partilhou uma analogia interessante, para distinguir estas duas formas de ensinar. Concretamente, o Mário Silva partilhou comigo a diferença entre fazer cópias e redações. Aproveitando esta diferença e, no caso, considerando os Professores que desejam ensinar os seus alunos a escrever, uns - professores - poderão utilizar os ditados ou as cópias como forma de lá chegar (equivalente aos Treinadores que Ensinam Jogadas) enquanto outros - professores - poderão utilizar as redações ou composições (semelhante aos Treinadores que Ensinam a Jogar) como forma de ensinar os seus alunos a escrever. Provavelmente aprender a escrever com base nas cópias poderia resultar numa escrita sem gramática, que é essencial para se escrever. Qual será a melhor forma de aprender a escrever, fazendo cópias ou redações? Nesta perspetiva, ensinar jogadas poderá ser o mesmo que ensinar a escrever sem gramática e, logo, a formar jogadores que não sabem "escrever" (leia-se jogar). 
Qual será a melhor forma de aprender a jogar, ensinar jogadas ou ensinar a jogar?

Será que ao jogar por conceitos, poderemos correr o risco de jogarmos todos de forma "igual"?
Recorrendo à música, é mais ou menos consensual que os músicos aprendem todos os mesmos "conceitos". Será que isso leva-os a comporem e tocarem todos a mesma música? No caso do Basquetebol acontecerá o mesmo, uma vez aprendidos os "conceitos", também podemos libertar e utilizar o potencial reprimido e ver os jogadores a "comporem música" e as equipas a "comporem sinfonias", em campo.

Reforço a ideia de que este processo de transformação foi "empurrado" pelas minhas crenças, insatisfação entre o que acreditava e o que fazia e pelas circunstâncias (começar por treinar pequenas grandes equipas, onde as derrotas se sobrepunham às vitórias) que desencadearam um processo de aprendizagem e desenvolvimento fantástico, que permitiram mudar essas circunstâncias.

O que esperar, se estamos habituados a ensinar jogadas e quisermos passar a ensinar a jogar?

Se já passou por esta experiência, poderá ter vivido situações idênticas às que vivi. Tendo treinado em todos os escalões, mas passando uma boa percentagem, com seniores, fui mais longe e não só passei a ensinar a jogar, como o fiz em equipas de seniores habituadas às jogadas. O que esperar nestes casos?

Quando na equipa temos jogadores como eu era, quando jogava, então irá "colher" apoio e motivação. Contudo, se alguns dos jogadores foram "formatados" às jogadas, então poderá "colher" resistência, no início, e confusão, a meio.

A resistência assemelha-se à de alguém habituado a andar de canadianas e que, de repente, vê o seu fisioterapeuta a retirar-lhe as canadianas e a pedir-lhe para caminhar sem ajuda. A confusão será semelhante a das pessoas que estão a aprender a conduzir. No início, temos de pensar em tudo, ficamos ansiosos, até tensos, mas depois, com a repetição e muita experiência, nem pensamos no que estamos a fazer, enquanto conduzimos. Foi ou não foi assim? Por isso, se passar a ensinar a jogar, quem estava habituado a fazer jogadas, será de esperar esta confusão, a meio do processo, e até poderá parecer que os jogadores não sabem o que estão a fazer, em alguns momentos. Mas, tal como fomos capazes de aprender a conduzir e, no início, tudo pareceu complicado e, hoje, provavelmente, já fazemos tudo automaticamente, o mesmo irá acontecer neste processo de mudança. Para tal, será necessário: acreditarmos nesta possibilidade; repetir, repetir e voltar a repetir; paciência e persistência. Porém, quando o conseguirmos, quer os jogadores, quer os treinadores, quer os adeptos poderão produzir e assistir a momentos fantásticos.

Os modelos de intervenção mais fechados - ensinar jogadas / jogo estruturado - condiciona a perceção, análise e decisão do jogador, enquanto os modelos de intervenção mais abertos - ensinar a jogar, conceitos / jogo elaborado - liberta e potencia a capacidade das pessoas que jogam realmente jogarem. Em ambos os casos, a tática necessita de execução, pelo que, tática sem execução, ainda não é tática ou jogar e não marcar, ainda não é jogar

Colhemos o que semeamos. Aprofundei esta ideia recentemente (Oliveira, 2021). Podemos "colher" copiadores / repetidores / marionetas ou escritores / compositores / atores.  Podemos "colher" incapacidade de nos adaptarmos ou capacidade de nos adaptarmos. 
Estamos satisfeitos com o que estamos a "colher", das sementes (jogo estruturado ou jogo elaborado) que plantamos na organização das equipas?
Se voltasse a ter 15 anos ou se tivesse um(a) filho(a) de 14 anos a jogar Basquetebol, qual das duas formas de organização (estruturada – jogadas - ou elaborada - conceitos) é que escolheria?

A este propósito da tomada de decisão, recomendo a leitura de um artigo de Silva e Talaia (2021) e a reflexão sobre o que Carmo (2020) escreveu:
"Resumindo, com sistemas o jogador é subalterno e depende da tática do treinador, no de “conceitos” o treinador fornece os critérios, mas depende da qualidade de leitura do seu jogador. Percebo as escolham e o risco envolvido, mas não tenham medo, que no fim são todos mais felizes."

3º MOMENTO / NECESSIDADE - A EXECUÇÃO

Por fim, ao jogar, os jogadores necessitam de EXECUTAR, de materializar as decisões e perceções e é aqui que a "técnica", o passe-receção, o drible, o lançamento (...) ganham maior relevo (embora a execução não se reduza à técnica). Pela minha experiência pessoal, se o passe e o drible permitiram reduzir os "turn-overs" e aumentar as tentativas de lançamento, o lançamento permitiu concretizar o objetivo do jogo de “Basketball” ou da bola no cesto.
A importância da execução pode ser destacada de muitas maneiras. Proponho abordar duas delas.
Primeira, todas as coisas são criadas duas vezes, Uma quando são imaginadas e outra quando são executadas (Covey, 2017)No caso do jogo, o que torna em realidade o que foi imaginado é a execução (técnica, …), com particular destaque para o lançamento (para os mais interessados, recomendo Oliveira, Tina & Faial (2002)), no ataque.


Segunda, construindo a partir da ideia que "saber e não fazer, ainda não é saber" - Lao-Tsé - poderemos dizer que percecionar e decidir e não executar, ainda não é tática. Ou seja, a tática ainda não é tática, sem execução, sem técnica.

Por isso, jogar também exige ensinar a executar, a técnica.


QUAL É A MELHOR “TÁTICA”?

Por tudo isto e integrando a abordagem de Carmo (2021b), a propósito dos "ondes", dos "quandos" e dos "comos"a melhor tática poderá ser a que valoriza os momentos ou necessidades do ato tático, proposto por Mahlo (1969), isto é:
  1. A perceção e análise da situação: ensinar “o que olhar e ver” - "ONDE"
  2. A tomada de decisão: ensinar os conceitos - QUANDO
  3. A execução: ensinar a técnica - COMO.

Referências

Bosc, G. (1992). A Construção do Ataque. III Clinic Internacional da Associação de Basquetebol de Coimbra.

Carmo, A. (2020). A saga da Tática Individual. Retrieved January 7, 2020, from https://ideiasparaobasquetebol.blogspot.com/2020/01/a-saga-da-tatica-individual-por-aniceto.html

Carmo, A. (2021a). Basquetebol: Ensinar a Pensar, Decidir e a Viver. In J. C. Oliveira & M. Silva (Eds.), Ideias para o Basquetebol: Juntos Vamos Mais Longe (pp. 91–95). Monee, IL, USA: Independently published.

Carmo, A. (2021b). Passar ou driblar e o Terceiro Ingrediente. In J. C. Oliveira & M. Silva (Eds.), Ideias para o Basquetebol: Juntos Vamos Mais Longe (pp. 121–128). Monee, IL, USA: Independently published.

Covey, S. R. (2017). O 8o Hábito: da Eficácia à Grandeza. Gradiva.

Mahlo, F. (1969). L’ Acte Tactique en jeu. Vigot Freres Editeurs.

Oliveira, J. C. (2000). Finalização em igualdade numérica: o “2x2 1/4 campo” como ponto de partida. Revista Técnica e Informativa “O Treinador,” 39, 7–12.

Oliveira, J. C. (2002). O ensino do Basquetebol. Gerir o presente, ganhar o futuro. Editorial Caminho.

Oliveira, J. C. (2021). História com “Sumo.” In J. C. Oliveira & M. Silva (Eds.), Ideias para o Basquetebol: Juntos Vamos Mais Longe (pp. 165–168). Independently published.

Oliveira, J. C., Tina, P., & Faial, H. (2002). Lançamento, a melhor “táctica.” Revista Técnica e Informativa “O Treinador,” 45, 23–25.

Ravelling, G. (1992). A Rebounders Workshop. Sysko’s Sports Books.

Silva, M. (2021). Como formar jogadores inteligentes? In J. C. Oliveira & M. Silva (Eds.), Ideias para o Basquetebol: Juntos Vamos Mais Longe (pp. 61–70). Monee, IL, USA: Independently published.

Silva, M., & Talaia, F. (2021). A Tomada de Decisão. Retrieved May 2, 2021, from https://ideiasparaobasquetebol.blogspot.com/2021/04/a-tomada-de-decisao-por-mario-silva-e.html


por João Oliveira
13-06-2021
(*) publicado originalmente a 14-2-2019 e atualizado na presente versão.









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