A Bola é Nossa - por Mário Silva

O minibasquetebol é um mundo repleto de emoções, onde as crianças aprendem muito mais do que apenas os fundamentos do basquetebol. Além das habilidades técnicas, o minibasquete pode proporcionar, dependendo do trabalho do treinador, uma rica educação emocional e comportamental, ajudando os jovens atletas a desenvolverem empatia, resiliência, trabalho em equipa e “agressividade”, entre outras competências emocionais e comportamentais.


O minibasquete não é apenas sobre o jogo em si, mas sobre o desenvolvimento integral das crianças, tanto emocional, comportamental, quanto social. As emoções desempenham um papel crucial na tomada de decisões, especialmente no contexto desportivo. Os treinadores, cientes disso, frequentemente criam cenários emocionais durante os treinos e jogos, para preparar os atletas a lidarem com a pressão, a frustração e a euforia. Esse trabalho não apenas aprimora as habilidades técnicas, mas também fortalece a inteligência emocional dos jogadores, permitindo-lhes tomar decisões mais assertivas, mesmo em situações de tensão.

 

A “agressividade” é uma atitude

Figura 1 - O objetivo defensivo das equipas de Minibasquete da Catalunha é serem equipas de luta, agressivas e com técnica e, para isso, muitas usam na defesa a frase: A BOLA É NOSSA. Foto FCBQ 2024.

 Este –A BOLA É NOSSA - é o mote para construir uma filosofia defensiva, que enfatiza uma mentalidade onde cada jogador é responsável por garantir que o adversário tenha o mínimo de oportunidades possível para marcar pontos e, para isso, nada melhor do que recuperar rapidamente a posse de bola.

Se explicarmos a um jovem jogador de 8 a 12 anos que a bola "é nossa", embora a outra equipa a tenha agora, qual será a sua reação? A resposta é previsível: eles irão procurar recuperar a bola. Assim, conseguimos fazer com que os mais jovens compreendam a ideia de proatividade, de competitividade e de agressividade defensiva que queremos fomentar.

J.L. Alderete, em seu livro Viva el caos, reforça esse conceito defensivo:

“Não sei por que se chama defesa. O objetivo básico é recuperar a bola. Não interessa se lançaram mal ou perderam a bola, o que importa é recuperá-la. O jovem deve ter fixo na cabeça que, se não tiver a bola, deve recuperá-la o mais rápido possível. Se o defensor for ultrapassado, ele deve se recuperar e continuar defendendo. Os cinco jogadores devem estar focados na recuperação da bola. Defendemos para forçar o erro do adversário e assim recuperar a posse. A intenção dos cinco jogadores é ter a bola para poder atacar. Não devemos esperar que o adversário nos entregue a bola por um passe ruim, um drible errado ou um lançamento falho. Com esse pensamento, a agressividade geral da equipe vai aumentar” (Vincent, 2020).

Por isso, há uma diferença a sublinhar: quando não temos a bola a ideia é esperar que o adversário nos entregue a bola ou ser proativo a recuperação da bola. Esta ideia de proatividade na recuperação da bola reflete a ideia de agressividade deste texto.

Para conseguir a posse de bola, a defesa naturalmente precisa ser agressiva. A agressividade não é uma emoção em si, mas uma atitude ou comportamento que pode ser alimentado por várias emoções, como determinação, paixão ou até frustração. Ela manifesta-se na forma como os jogadores abordam as tarefas do jogo, especialmente na defesa.

Um jogador determinado manifesta uma agressividade positiva, focada na recuperação da bola ao ser proativo. Por outro lado, uma agressividade negativa ou a falta dela pode levar à frustração, onde o jogador pode cometer faltas desnecessárias ou perder o controle emocional. No basquetebol, a agressividade é mais uma expressão de comportamento e atitude competitiva do que uma emoção pura, sendo essencial para desempenhos defensivos eficazes no jogo.


Cenários emocionais

O Minibasquete é um mundo de emoções onde se aprende mais do que apenas basquetebol. Os treinadores criam, nos treinos, cenários emocionais, que influenciam a tomada de decisões dos jovens atletas.

No trabalho defensivo, a ideia central não se restringe apenas aos hábitos necessários para a defesa no 1x1, mas também envolve a tomada de decisão defensiva, incentivando-a em vez de impor rotações defensivas. O mais importante é destacar a defesa no 1x1 como o conceito defensivo básico, sem o qual não podemos progredir.

Um exemplo disso é a adaptação de um exercício clássico de 1x1 em três áreas diferentes, proposto por Juan Antonio Garcia Herrero nas VII Jornadas de Formação C.B.G. 2024.

Figura 2 – O treinador de andebol Juan Herrero abordou no Clinic o tema: El desarrollo de la responsabilidade en el entrenamiento del jugador. Foto Clinic CBG 2024.

Jogos de 1x1: O defensor marca seu oponente direto e faz a rotação. Ele defende cinco vezes consecutivas e, em seguida, sai.

Figura 3 – Jogos de 1x1.

O objetivo do exercício é o de avaliar a agressividade e a técnica dos atletas.

 

Metodologia

A metodologia utilizada leva em conta a tomada de consciência e a avaliação compartilhada. "Tomar consciência" refere-se ao processo pelo qual o atleta percebe, reconhece e entende uma situação ou realidade, que antes não era notada ou compreendida. Esse processo envolve o despertar de uma perceção crítica e o reconhecimento da importância ou das implicações de algo. É como "acordar" para algo que estava presente, mas não era percebido. Por exemplo, no caso concreto do exercício, o jovem "toma consciência" de que não está conseguindo recuperar a bola, o que é prejudicial, e decide mudar isso.

Já a "avaliação compartilhada" refere-se a um processo em que a análise e o julgamento da situação defensiva proposta são realizados conjuntamente por várias partes interessadas. Isso significa que, em vez de uma única pessoa ou entidade tomar a decisão ou fazer a avaliação, diferentes perspetivas e conhecimentos são considerados para chegar a um consenso ou entendimento comum. É um processo colaborativo, onde, neste exemplo, os envolvidos são os atletas e os treinadores, que têm voz ativa na determinação da eficácia da metodologia de ensino.

Esses dois conceitos são importantes porque promovem a conscientização e a colaboração para alcançar objetivos comuns, neste caso, defender bem.

Figura 4 – Esta metodologia aborda a importância de estabelecer uma cultura de responsabilidade e compromisso dentro da equipa. Foto 2024.

A equipa definiu que deseja ser caracterizada por luta, agressividade e técnica. Para medir esse padrão, os jogadores são convidados a se autoavaliar numa escala de 0 a 10, especificamente em relação à agressividade e técnica. Quando um jogador se avalia com uma nota baixa (como 4 ou 5), é fundamental que ele tome consciência de que a equipa almeja ser mais combativa e técnica e que, para isso, ele precisa melhorar o seu desempenho.

A mudança de comportamento não deve ser motivada pelo medo de punição, mas sim pela compreensão e responsabilidade compartilhada de que a equipa pertence a todos, e não apenas ao treinador. O treinador desempenha um papel crucial ao ajudar os jogadores a perceberem a necessidade de mudança e a desenvolverem comportamentos positivos, mas a mudança em si depende do jogador.

Com o tempo, essa competência consciente evolui, permitindo que o jogador mude seus hábitos de forma natural e inconsciente.

A corresponsabilidade é essencial: participar do treino e adotar atitudes e comportamentos responsáveis refletem o comprometimento com o crescimento da equipe.

 

Conclusão

Recorrendo mais uma vez aos e-mails do Professor Jorge Araújo, podemos facilmente aceitar que: “se os jovens não estiverem suficientemente mobilizados pelo objetivo de alcançar resultados significativos, dificilmente terão sucesso. Está bem demonstrado que somente iniciamos o caminho do sucesso quando passamos da fase de nos querermos divertir com uma determinada prática para a fase de nos apaixonarmos por essa atividade. Isso significa que, enquanto as crianças "andam por ali" sem um propósito definido além de se divertir, elas nunca evoluirão como se espera. Portanto, cabe aos treinadores criar um contexto no Minibasquete que envolva e entusiasme as crianças participantes. O objetivo é provocar nelas um desejo intenso de se tornarem atletas de alto rendimento, levando-as a participar da prática desportiva de maneira mais responsável e comprometida com o objetivo de se tornarem atletas reconhecidos e distinguidos ao mais alto nível. Alternativamente, é importante deixar claro que algumas dessas crianças podem ter um futuro mais promissor em áreas acadêmicas ou artísticas, mas nunca desportivas.”

 

Bibliografía

VINCE, J. L. (2020). Viva el caos: Baloncesto en estado puro desde los 11 a los 16 años (Spanish Edition). Autor.

HERRERO, J. A. (2024). El desarrollo de la responsabilidad en el entrenamiento del jugador. In: VII JORNADAS DE FORMACIÓN C.B.G..

ARAUJO, J. Sugestões para o treino de basquetebol. Mensagem enviada para Mário Silva, 26 ago. 2024.

 

por Mário Silva

07-09-2024








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