Jogar à Bola e Jogar Minibasquete - por Mário Silva

 

A transição das crianças de "brincar com a bola" para "jogar Minibasquete" depende de um ambiente de treino envolvente e desafiador, no qual o treinador desempenha um papel fundamental. Ele deve criar condições que despertem o interesse e a motivação das crianças, promovendo uma aprendizagem significativa, que vá além da repetição de movimentos. É essencial integrar intensidade e propósito no treino, além de cultivar valores como a disciplina, a responsabilidade e a capacidade de aprender com os erros, garantindo assim o desenvolvimento pleno dos jovens atletas.

Na iniciação ao basquetebol, o lúdico é fundamental, mas muitos treinadores impõem cenários excessivamente regulados e estáticos, limitando o verdadeiro jogo. Jogar à bola não é o mesmo que jogar Minibasquete, que exige compreensão do jogo coletivo e comprometimento.

Com treinos repetitivos e pouco desafiadores, desconectados do jogo e da intensidade da competição, a formação dos jovens estagna. Treinadores passivos focam-se na eficácia imediata, negligenciando a aprendizagem da competição e a adaptação ao erro.

Disciplina, responsabilidade e criação de hábitos são essenciais para o desenvolvimento dos jovens, que devem jogar de forma livre, instintiva e com regras que promovam seu crescimento.

Figura 1 – Jornadas de Formação do C.B.Q. Foto VII Jornadas de Formação. 2024

O treinador Valentin Plaza "Moni" clarificou, no Clinic, os dois conceitos fundamentais:

"O jogo da bola é universal e não tem limite de idade. A iniciação desportiva deve começar com o jogo da bola e não diretamente com o basquetebol, para que as crianças desenvolvam um gosto natural pelo desporto. Já jogar Minibasquete exige um compromisso total; quem não está disposto a dedicar-se completamente deveria buscar outra atividade. A verdadeira democratização do desporto ocorre quando todos têm a oportunidade, mas a motivação intrínseca de ser melhor, como os grandes jogadores, é o que faz a diferença. Aqueles que realmente desejam melhorar dedicam-se a treinar mais, passando horas praticando e provando a sua capacidade." (Plaza, 2024).

Plaza observou que muitos jovens jogam a bola apenas para se divertir, sem interesse em aprender. A derrota não lhes importa e os pais só querem que joguem, sem maiores expetativas. Se têm uma viagem ou uma festa com amigos ou família, não vão ao jogo ou faltam aos treinos. Em contraste, quem busca crescimento verdadeiro joga basquetebol com seriedade, encontrando espaço para se divertir e socializar, mas sempre com um propósito competitivo em mente. Jovens motivados pelo Minibasquete ouvem atentamente o treinador e os companheiros, aprendendo a competir de verdade.

O compromisso é uma parte essencial de jogar Minibasquete; quem está realmente comprometido quer jogar e ganhar, integrando-se num grupo com regras e compromisso.

Plaza enfatiza:

“que é fundamental encontrar uma "tribo" (clube/equipa) que compartilhe as mesmas expectativas e comprometimento”.

Se alguém não está disposto a dedicar-se completamente, provavelmente deveria procurar outra atividade, pois o Minibasquete exige compromisso — sem desculpas ou ausências. A ideia de tratar todos de forma "democrática" nem sempre funciona; todos os jovens devem ter as mesmas oportunidades, mas nem todos merecem o mesmo, pois nem todos se esforçam igualmente. Quem não aceita o compromisso ou as regras pode acabar apenas divertindo-se com a bola, sem levar o Minibasquete a sério, e é provável que abandone o desporto.

Plaza também destacou:

“que o compromisso com o Minibasquete exige motivação para treinar, seguir regras e superar desafios, como roubar uma bola na defesa. Ele alertou que, nos tempos atuais, a influência negativa dos pais pode desvalorizar o trabalho do clube, e a falta de respeito e cumprimento das regras pode resultar na exclusão. No passado, os clubes não envolviam tanto os pais, mas hoje é um desafio equilibrar essa presença sem que prejudique o ambiente desportivo”.

Como aprendem a jogar Minibasquete?

Figura 2 – O Professor Jorge Araújo, com quem troco frequentemente e-mails, o que permite que continue a aprender e a refletir sobre a modalidade. Foto Conferência APCC Porto 2017.

Na correspondência, o tema do Minibasquete, da aprendizagem e do treino são recorrentes.

Citando um dos últimos e-mails, de 26 de agosto de 2024:

“Como é que qualquer um de nós aprende e treina? Sentindo, percebendo, imaginando, pensando, agindo com base num gradual 'saber do corpo' adquirido através da repetição frequente, que conduz à aquisição dos hábitos pretendidos. Isso significa que aprendemos e treinamos enquanto temos experiências diversas, aprendendo a fazer, fazendo. No desporto, e particularmente no Minibasquete, esse 'saber do corpo' refere-se à aquisição de habilidades motoras e cognitivas por meio da repetição constante. Quando as crianças repetem ações como driblar, passar e lançar, essas ações tornam-se hábitos. Este processo, chamado de 'incorporação', é como o corpo 'aprende' e automatiza movimentos, permitindo que, com o tempo, essas ações sejam realizadas de forma mais fluida e eficiente. Mas não é só isso! Se não estivermos altamente mobilizados pelo objetivo de alcançar resultados significativos, dificilmente teremos sucesso. Está hoje bem demonstrado que apenas iniciamos o caminho do sucesso quando ultrapassamos a fase de querer apenas nos divertir com uma prática e entramos na fase de nos apaixonarmos por essa atividade. Isso significa que, enquanto as crianças 'andam por ali' sem um propósito definido além de se divertirem, nunca evoluirão como pretendido. Cabe, então, aos treinadores a responsabilidade de criar um contexto nas diferentes modalidades que envolva e crie entusiasmo nas crianças. Em essência, é preciso provocar nessas crianças um forte desejo de se tornarem atletas de alto rendimento, um desejo que as motive a participar na prática desportiva de forma responsável e focada no propósito de serem futuramente atletas reconhecidos ao mais alto nível. Ou, alternativamente, torne evidente que para algumas dessas crianças será reservado um futuro em outras áreas, seja acadêmico ou artístico, mas não desportivo.” (Araújo, 2024).

O veterano espanhol Pepe Laso também tem opinião sobre o tema.

Figura 3 – O mestre Pepe Laso. Foto Isportcoach 2024

No Clinic da Agrupación Baloncesto Villaviciosa de Odón, Laso destacou:

“A importância dos primeiros passos na vida desportiva dos jovens.

O treinador tem o papel crucial de ensinar a gostar do jogo e a jogá-lo. Qualquer planeamento técnico excessivo é contraproducente, pois o jogo deve estar ligado à diversão.

As crianças precisam se divertir no treino, e a bola é a ferramenta central para isso.

Não se deve afastar a bola das crianças, pois isso prejudica a aprendizagem. Para os Minis, longos discursos, sessões de alongamento ou aquecimentos elaborados não são necessários.” (Laso, 2018).

Os treinadores devem criar um contexto no Minibasquete que envolva e entusiasme as crianças, dando-lhes um propósito claro e motivador. Esse "querer muito" ser jogador de basquetebol é essencial, para que elas se dediquem de forma responsável e comprometida, evoluindo de uma interação casual com a bola para uma prática focada no desenvolvimento das habilidades necessárias para se tornarem grandes jogadores.

 

O papel do treinador

Regressando aos e-mails do Professor Jorge Araújo, podemos clarificar melhor a função de ser treinador:

“É responsabilidade do treinador criar um ambiente de treino que vá além da simples diversão.

O treinador deve ser capaz de envolver as crianças emocional e mentalmente, criando um propósito claro para o treino. Esse propósito é o desejo de se tornar um bom jogador de basquetebol. Quando as crianças estão motivadas por esse desejo, elas participam de maneira mais responsável e comprometida. Isso não significa apenas seguir as instruções, mas ter a vontade interna de melhorar, aprender e se dedicar ao desporto.

 A prática precisa ter intensidade para que as experiências de treino se tornem significativas e, eventualmente, automáticas. Essa intensidade pode vir do nível de desafio, da competitividade ou do envolvimento emocional das crianças.

A aprendizagem, especialmente no contexto do Minibasquete, é um processo que envolve não apenas a mente, mas também o corpo, através da repetição e incorporação de habilidades motoras e cognitivas.

A essência desse processo reside na transição de 'jogar a bola' para 'jogar basquetebol', destacando a importância de uma aprendizagem significativa e intencional. Para que essa aprendizagem seja eficaz, é fundamental que os treinadores compreendam como ocorre o desenvolvimento das habilidades desde a infância.

O jovem atleta começa com a perceção sensorial, a imaginação e o pensamento, progredindo para ações repetidas que levam à incorporação de hábitos. Esta incorporação é o que permite que as habilidades se tornem automáticas e realizadas de forma fluida e eficiente.

No Minibasquete, especificamente, é necessário que os treinadores criem um ambiente que vá além do simples ato de brincar com a bola. Eles precisam instigar nas crianças um propósito claro e uma motivação forte para se tornarem jogadores de basquetebol. Esse 'propósito' é crucial para que as crianças se envolvam de maneira significativa e desenvolvam o compromisso necessário para progredir no desporto.” (Araújo, 2024)

O Prof. J. Araújo, ao envolver conceitos neurocientíficos e filosóficos, sugere que uma experiência só se torna consciente e se transforma em hábito quando atinge um certo nível de intensidade. Ou seja, para que a aprendizagem seja duradoura e significativa, é necessário que as crianças estejam profundamente com prometidas e motivadas.

Esse comprometimento é o que permite a transição de atividades lúdicas para um treino focado no desenvolvimento de habilidades específicas do basquetebol.

Conclusão

Jogar à bola é diferente de jogar Minibasquete. Ambos envolvem direitos e responsabilidades, mas apenas o Minibasquete exige compromisso e desejo de competir.

Os treinadores desempenham um papel crucial na criação de um ambiente que não apenas ensine as habilidades necessárias, mas também motive e inspire as crianças a tornarem-se grandes jogadores de basquetebol.

O sucesso desse processo depende da capacidade do treinador proporcionar uma experiência de aprendizagem que seja envolvente e direcionada para objetivos claros.

Para transformar o Minibasquete e melhorar a qualidade do basquetebol, é necessário implementar alterações radicais na base da prática do jogo, tanto na escola quanto no clube.

Isso inclui modificar a atitude dos professores e treinadores em relação ao ensino e ao treino.

Sem essas mudanças, será difícil alcançar os resultados desejados.

 

Bibliografia:

ARAÚJO, Jorge. E-mail enviado em 26 de agosto de 2024.

LASO, P. Clínic da Agrupación Baloncesto Villaviciosa de Odón. 2018.

VII JORNADAS DE FORMAÇÃO C.B.Q. Clínic conduzido por Valentin Plaza, 2024.


por Mário Silva

14-09-2024








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