Os
conceitos "A bola é nossa" e "Defesa livre"
são fundamentais no ensino da defesa nos escalões de formação.
Ao
explicar a uma criança de 8 a 12 anos que a bola "é nossa", mesmo
quando está com a outra equipa, ela tende a reagir com um desejo natural de
recuperá-la. Essa abordagem ajuda a promover a competitividade desde cedo, com
o treinador a ensinar a técnica e a tática individual, para concretizar esse
objetivo.
A "Defesa Livre" incentiva os jogadores a lerem as situações de jogo e a decidirem a melhor opção defensiva em cada momento. Essa abordagem desenvolve a capacidade de tomar decisões em campo, baseada na vontade de vencer, experiência adquirida e hábitos. Para o treinador, isso exige um conhecimento mais profundo e a habilidade de guiar os jogadores na aquisição desses hábitos, sem proibições que limitem a aprendizagem.
O conceito de
"Defesa Livre"
O Clube Estoril Basket recebeu os experientes treinadores catalães Jou Marimon e Jordi Serra (Figura 1). Os treinadores do clube tiveram a oportunidade de trocar ideias e conhecer o trabalho desenvolvido na modalidade em Espanha.
Troco
correspondência com ambos regularmente e, em um dos últimos e-mails
(18/11/2023), eles reforçaram o que já haviam dito no Estoril: "Defensa
libre es tan solo la idea que utilizamos en el club para que nuestros jugadores
de U10 a U13 aprendan a leer las situaciones del juego y decidan cuál es la
mejor opción defensiva en cada."
A
expressão "Defesa Livre" refere-se a um conceito tático no qual os
jogadores são incentivados a avaliar a situação do jogo em tempo real e tomar
decisões defensivas adequadas. Em vez de seguir um esquema rígido, o
objetivo é que os jogadores desenvolvam a habilidade de ler o jogo, identificar
ameaças e escolher a melhor estratégia defensiva para cada momento específico.
Essa aprendizagem é especialmente crucial para os atletas mais jovens, que
precisam desenvolver a capacidade de interpretar as situações do jogo e decidir
a melhor opção defensiva para cada circunstância.
Assim, como
fazemos no ataque, queremos que o jogador compreenda, na defesa, o motivo de
suas decisões táticas, o que elas implicam e como reagir às decisões dos
companheiros. A abordagem geral no trabalho defensivo não se limita apenas aos
hábitos necessários no 1x1, mas também enfatiza a tomada de decisões na defesa,
favorecendo-a em vez de impor rotações defensivas. O fundamental é insistir
na defesa 1x1 como o conceito básico, sem o qual não podemos progredir.
Uma defesa livre
e proativa
A
defesa livre e proativa no basquetebol tem como objetivo iniciar a
ação a partir da defesa, reconhecendo que o jogo é uma constante troca de
ações e reações. Embora não seja possível defender de forma proativa o tempo
todo, essa abordagem destaca-se pela sua
imprevisibilidade, antecipando as jogadas do ataque e envolvendo todos os
jogadores numa ação coletiva. A comunicação é crucial, especialmente em
momentos-chave, como após descontos de tempo, lances livres ou no início dos
quartos.
O
objetivo da defesa proativa não é apenas roubar a bola, mas também impedir
que o ataque execute as suas movimentações habituais, criando caos e
enriquecendo a tática da equipa.
No
entanto, é fundamental avaliar os custos e benefícios dos riscos envolvidos. A
defesa proativa caracteriza-se por ações que surpreendem o ataque,
impedindo-o de executar as suas jogadas desejadas. Para que isso aconteça, é
essencial que os defensores possuam uma compreensão profunda do jogo, o que
lhes permite antecipar as jogadas adversárias e tomar decisões defensivas
eficazes.
A
defesa proativa não se limita a reagir ao ataque; ela procura influenciá-lo e
controlá-lo, garantindo que a equipa adversária não consiga atuar da forma que
gostaria.
Exemplos de
defesa livre e proativa
Vamos tomar
como exemplo a aplicação individual do conceito de defesa livre e proativa na
marcação ao jogador com bola em drible por todo o campo. O defensor avalia a
situação do jogo e as características do adversário direto para tomar decisões
apropriadas em tempo real.
A técnica
defensiva para evitar a penetração do atacante em direção ao cesto envolve uma
combinação de posicionamento, distância, movimentação e uso adequado do corpo
para bloquear o caminho do adversário.
O objetivo do defensor é impedir que o
atacante penetre em direção ao cesto. Para isso, ele deve seguir a regra
básica de manter sua posição entre o atacante e o cesto, evitando que o
adversário realize uma entrada fácil.
Em
relação à distância de marcação ao jogador com bola em drible, em situações
normais, uma distância de um braço (Figura 2) é geralmente apropriada.
No entanto, a variabilidade na abordagem defensiva em relação à distância de
marcação resulta de uma combinação de fatores, como as características dos
jogadores, a situação do jogo, a estratégia da equipa e a leitura das ações em
tempo real.
Numa
defesa livre e proativa, os jogadores são treinados para criar incertezas e
dúvidas no atacante, influenciando suas decisões no jogo. Para isso, eles variam
a distância de marcação, alternando entre distâncias mais curtas e mais
longas, o que cria dificuldades para o atacante e, em alguns casos, força uma
violação da regra dos 8 segundos.
Luis
Riera, treinador espanhol de basquetebol, é conhecido por enfatizar o uso
inteligente do corpo na defesa, destacando a importância de controlar o espaço
e aplicar pressão de maneira estratégica para desestabilizar o adversário.
Riera
(Figura 3) ensinou: “como variar a distância de marcação e como utilizar o
corpo de forma adequada para influenciar as opções e o comportamento do
atacante, ajudando a desenvolver jogadores que aplicam técnicas defensivas
eficazes” Riera (2022).
Para acompanhar o atacante, o defesa usa o
“slide” e
o “cross step”,
cada um com uma função específica na contenção do atacante.
O slide é o movimento lateral
básico que o defensor utiliza para acompanhar o atacante enquanto mantém uma
postura baixa e equilibrada. A ideia é que o defensor seja capaz de se mover
rapidamente, mantendo sempre o atacante à frente e controlando o espaço de forma
eficaz.
O cross step, ou passo cruzado, é
utilizado em situações em que o slide não é suficiente para acompanhar a
velocidade ou a mudança de direção do atacante.
Neste movimento, um pé cruza na frente do outro, permitindo uma rotação
rápida do corpo.
Ambos
os movimentos são importantes para a defesa, e sua aplicação correta depende da
situação específica no campo. O slide é ideal para manter o equilíbrio e
a posição quando o atacante se move lateralmente, enquanto o cross step
é útil para se ajustar rapidamente a mudanças inesperadas na direção do
atacante. O treino dessas técnicas pode ajudar a desenvolver a habilidade do
defensor em aplicar uma defesa eficaz e inteligente.
A
forma mais básica de usar o corpo na defesa (Figuras 6, 7 e 8) é garantir um
bom posicionamento inicial entre o atacante e o cesto, mantendo uma
postura baixa e equilibrada, o que permite realizar movimentos laterais com
rapidez. Embora o uso excessivo das mãos seja limitado, o contato corporal é
legal e necessário.
O “Hand
checking” e o cilindro…
No basquetebol, as regras sobre o controle
do atacante com a bola e o uso das mãos, como o "hand checking"
e a interferência no cilindro, são fundamentais para garantir um jogo justo e
seguro, conforme estabelecido pelas regras da FIBA (2018).
Segundo
as regras em vigor, o "hand checking" ao driblador é ilegal.
Os defensores não podem usar as mãos ou os braços para controlar ou desviar o
atacante de sua trajetória em drible. Isso é considerado uma falta e resulta em
penalização. Pequenos contatos acidentais podem ser permitidos, mas qualquer
uso das mãos que impeça a liberdade de movimento do atacante deve ser
sancionado.
O
princípio do cilindro refere-se ao espaço vertical que um jogador ocupa
no campo. Imagine um cilindro invisível ao redor de cada jogador, que se
estende desde o chão até acima de sua cabeça. Dentro desse cilindro, o jogador
tem o direito de se movimentar sem ser invadido por outro jogador. Tanto os
atacantes quanto os defensores têm o direito de manter-se dentro de seu próprio
cilindro. O contato físico que ocorre fora desse cilindro, como invadir o
espaço do oponente ou empurrar com o corpo ou braços, é geralmente considerado uma
falta.
Assim,
o defensor deve manter sua posição dentro de seu cilindro ao contestar o
movimento do atacante. Ele não pode estender braços ou pernas para fora desse
espaço, pois isso poderia restringir o movimento do atacante.
Essas
regras são essenciais para preservar o espírito do jogo. Os jogadores não podem
recorrer ao físico em detrimento da habilidade e da técnica, que são os
principais fatores determinantes no desempenho das equipas.
“Novas
regras” nos J.O.
Contudo,
nos recentes Jogos Olímpicos, a seleção do Canadá adotou uma abordagem
defensiva agressiva em relação ao portador da bola, que claramente subverte as
regras estabelecidas. O jogo entre Grécia e Canadá revelou uma “nova” realidade
defensiva, destacando uma forma de jogar que desafia as normas tradicionais de
defesa.
A
seleção nacional de basquetebol do Canadá apresentou um estilo defensivo
distinto e eficaz nos Jogos Olímpicos, refletindo a filosofia e a abordagem
tática de Jordi Fernández (Figura 11). Fernández é conhecido por sua capacidade
de adaptar estratégias defensivas conforme as características dos adversários.
A
equipa canadiana frequentemente ajustou suas abordagens defensivas durante os
jogos para explorar as forças e fraquezas dos oponentes. Adotando uma abordagem
agressiva, o Canadá aplicou pressão constante no portador da bola, forçando
erros como dribles ou passes imprecisos. A equipa demonstrou uma sólida
compreensão das estratégias defensivas, utilizando essa inteligência para criar
turnovers e explorar os erros dos adversários. A seleção foi treinada
para manter uma agressividade disciplinada, focada em evitar faltas
desnecessárias, enquanto mantinha boas posições defensivas.
A
seleção do Canadá utilizou técnicas defensivas como o "hand checking"
para aplicar pressão sobre o portador da bola e controlar o jogo (Figuras 12,
13 e 14). Essa abordagem foi eficaz em muitos aspetos, permitindo que a equipa
muitas vezes defendesse de maneira mais agressiva do que o regulamento permite.
O ajuste da defesa às exigências do jogo e às interpretações das arbitragens
nos Jogos Olímpicos foi fundamental para o relativo sucesso da seleção.
O
uso do antebraço para controlar o portador da bola foi uma prática
recorrente de muitas seleções na França (Figuras 16 e 17). No contexto da
seleção olímpica do Canadá, o uso do antebraço como ferramenta defensiva foi
particularmente notável, especialmente devido à abordagem física da equipa.
Utilizar
o antebraço permite ao defensor manter um contato físico adicional com o
portador da bola, oferecendo um meio extra de controle e direcionamento. Isso é
útil para prevenir penetrações e manter o atacante fora de sua trajetória
ideal. Além disso, o antebraço foi empregue para interromper ou
desestabilizar o movimento do portador da bola, forçando-o a ajustar seu jogo e
potencialmente cometer erros.
Embora
essa técnica seja eficaz, deve ser utilizada com cuidado para não violar as
regras e evitar penalidades, garantindo que a defesa se mantenha dentro dos
parâmetros regulamentares. No entanto, essa precaução nem sempre foi observada
durante a competição.
O
uso do contato com o peito e a técnica de mostrar as mãos são
métodos defensivos importantes para controlar o portador da bola e minimizar a
possibilidade de faltas. O contato com o peito (Figuras 18, 19, 20 e 21)
permite ao defensor manter uma presença física constante, bloqueando o caminho
do atacante e evitando penetrações. Além disso, essa técnica ajuda a
desestabilizar o jogador adversário, forçando-o a ajustar sua posição e tomar
decisões mais difíceis. No entanto, durante os Jogos Olímpicos, nem sempre as
regras foram cumpridas em relação a essas técnicas.
Figuras 22 e 23 - No basquetebol, técnicas defensivas como o uso da mão exterior para roubar a bola e posicionar a mão na linha de passe são essenciais para criar oportunidades de turnovers e interromper o ataque adversário. Fotos FIBA 2024.
O
roubo de bola com a mão exterior (Figura 22) envolve o defensor usando a
mão que está mais longe da linha central do corpo para tentar capturar a bola
sem expor completamente seu próprio corpo. A eficácia dessa técnica depende do “timing”
e da técnica, com o defensor precisando antecipar o movimento do atacante e
estender a mão exterior no momento certo.
Já
a técnica de colocar a mão na linha de passe (Figura 23) consiste em
posicionar a mão para intercetar ou desviar passes do adversário, seja
bloqueando a visão do passador ou cortando a trajetória do passe. A leitura do
jogo é crucial para posicionar a mão corretamente e aumentar as chances de intercetação.
Ambas
as técnicas são essenciais para interromper o ataque adversário e criar
oportunidades para a defesa. É importante que sejam utilizadas de forma a
respeitar as regras e evitar faltas, pois isso afeta significativamente o
desempenho defensivo e a capacidade de controlar o jogo.
Lidar com a Agressividade
Vassilis
Spanoulis (Figura 24) foi um dos maiores jogadores de basquetebol da Grécia e
um ícone do basquetebol europeu, liderou a equipa olímpica grega.
Para
lidar com a agressividade defensiva da equipa do Canadá, o treinador Spanoulis
tentou várias abordagens.
"Fizemos muitos bloqueios iniciais para evitar a
pressão" explicou
Spanoulis sobre como tentou ajustar o ataque. "Tentamos levar a bola
com o jogador oposto ao Dort, porque ele é muito bom na pressão da bola. Acho
que começamos o jogo um pouco pressionados e eu não entendi isso. Levou-nos
meio jogo para perceber que precisamos jogar um grande basquete, o nosso
basquete, e mostrar nosso caráter. Esse tempo perdido foi muito"
Basketnews. (2024).
De
facto, tanto Brooks quanto Dort utilizaram e abusaram do contato físico na
pressão defensiva, o que representou um desafio significativo para a equipa
grega. A abordagem agressiva desses defensores criou dificuldades para
Spanoulis e seus jogadores, exigindo ajustes táticos e estratégicos para lidar
com a intensidade e a pressão impostas por eles.
Spanoulis
também expressou preocupações sobre o nível de contato físico permitido aos
defensores poderosos Dillon Brooks e Lu Dort.
"Acho que eles cometeram muitas faltas, mas os
árbitros nada marcaram. Eles jogaram muitas vezes com as duas mãos e muitas
vezes eu não entendia por que a situação era avaliada de forma diferente dos
dois lados,"
disse Spanoulis. "Mas na segunda parte, aprendemos e fomos mais
agressivos" Basketnews. (2024).
Conclusão:
A
defesa livre permite que os jogadores corram riscos e tomem decisões
dinâmicas. Para formar jogadores inteligentes, é essencial ensiná-los a ler o
jogo e tomar boas decisões tanto no ataque quanto na defesa. Os jogadores
precisam reagir rapidamente e ajustar as suas ações com base nas situações do
jogo e nas reações dos companheiros de equipa.
Uma
defesa proativa envolve uma atitude ofensiva na defesa. Defender de
forma proativa significa atacar a equipa adversária com a defesa, criando
problemas e incertezas para o ataque, o que aumenta a eficácia defensiva.
Utilizar diferentes abordagens defensivas torna mais difícil para o ataque
encontrar soluções, aumentando as dúvidas e dificuldades enfrentadas pelos
atacantes.
Defender
agressivamente é crucial para o sucesso. Uma atitude firme e uma técnica
adequada ajudam a inibir o ataque e a controlar o jogo. O uso efetivo do corpo
confere vantagens defensivas e pode inibir o ataque adversário. Recentemente,
os Jogos Olímpicos mostraram uma tendência crescente do uso físico na defesa,
especialmente contra o portador da bola. É necessário que a FIBA forneça
orientações claras sobre o uso do corpo na defesa, para definir melhor os
limites e permissões nas ações defensivas.
Bibliografia
Riera, L.
(2022). Básicos defensivos en el baloncesto de formación. [YouTube video].
SINEB. Disponível em https://youtu.be/u--EBW5RHpQ?si=zdtXAhPSj8C3DDxg.
Basketnews.
(2024, 27 de julho). Spanoulis reacts to Giannis' 34-point night, questions
calls on Brooks and Dort. Disponível em https://basketnews.com/news-209716-vassilis-spanoulis-on-giannis-34-point-night-and-disagreement-over-brooks-and-dort.html.
FIBA.
(2018). Regras oficiais do basquetebol. Federação Portuguesa de
Basquetebol. https://www.fpb.pt/wp-content/uploads/2020/07/Regras_Oficiais.pdf
por Mário Silva
05-10-2024
#basquetebol #basketball #ideiasparaobasquetebol #baquetebolqueconta #juntosvamosmaislonge #basquetebolasuamedia #basquetebol5estrelas #basquetebolcomideias