“Caçar Dois Coelhos de uma só cajadada” é uma expressão que destaca o valor de soluções que resolvem não apenas um, mas dois problemas. Imagine-se agora relevância de uma solução que resolvesse quatro necessidades/desafios do nosso basquetebol.
O texto que se segue tem dois objetivos:
1. Identificar 4 Necessidades / Oportunidades
2. Propor uma “cajadada”, uma solução, para resolver esses 4 problemas
PRIMEIRA PARTE – AS 4 NECESSIADES
NECESSIDADE #1 – Defender o Jogador Com Bola Sem ajudas
No livro “O Puzzle do Selecionador Nacional de Basquetebol”, relatório da preparação e participação de uma Seleção Nacional de Cadetes, num Campeonato Europeu, pode-se ler “acreditámos que é fundamental, no ensino do jogo, investir fortemente na (…) capacidade de defender o jogador com bola sem necessidade de ajudas” (Oliveira, Tina, & Hugo, 2003, p. 220). Esta ideia tem sido recorrente. A propósito, quantos treinadores não gostariam que os seus jogadores e equipas conseguissem defender a bola sem a necessidade dos seus colegas de equipa o ajudarem? Curiosamente, o ensino do jogo, nos Minis, começa com defesa “cada-um-ao-seu” e ao mais alto-nível, dada a exigência das numerosas rotações defensivas e dada a elevada percentagem de lançamentos dos jogadores sem marcação, a defesa termina como começou, ou seja, com “cada-um-ao-seu”. Contudo, sem a capacidade de os jogadores pararem o atacante com bola sem ajudas, dificilmente se jogará, quanto mais competirá ao mais alto-nível. Por isso, parar a bola, sem ajudas, é uma necessidade.
NECESSIDADE #2 – Estímulos claros
Quando pretendemos ensinar a jogar em vez de jogadas, os jogadores têm necessidade de percecionar (observar) estímulos claros. Para me fazer entender, imaginem-se duas situações, uma em que um aluno da 3ª classe tem perante ele um texto (história) escrito em português e outro em que o mesmo aluno tem uma história em que cada palavra é escrita numa língua diferente, por exemplo a 1ª em português, a 2ª em inglês, a 3ª em francês e assim sucessivamente. Qual dos dois textos oferecia ao aluno um estímulo claro? Qual criaria mais confusão? Qual levaria os ouvintes a estarem atentos à história que estava a ser lida? O mesmo acontece, quando se ensina os jogadores a lerem o jogo. Os jogadores têm necessidade de o jogo estar escrito só em “português”, diminuindo a complexidade e a confusão, de forma a responderem correta e oportunamente ao que estão a ler. Porém, quando esses estímulos não são claros, é confuso ler o jogo e desconfortável vê-lo a ser jogado. O que é que pode criar essa confusão “linguística” no jogo? As defesas em que os estímulos não são claros, como por exemplo quando uma equipa não defende HxH ou Zona, mas antes “Zomem” (“dá espaço”). Por isso é que, quando as melhores equipas jogam com algumas das equipas mais fracas, jogam pior ou os jogos tornam-se mais difíceis, por as equipas não saberem exatamente o que as outras estão a defender, ora defendem com 2x1, à zona, “linha”, “gelo”, (…) no bloqueio direto, não por estratégia, mas sim por confusão. Resumindo, defender de uma forma organizada, estruturada e deliberada é essencial para os estímulos serem claros e consequentemente se ensinar a jogar em vez de jogadas e isso começa com um estímulo claro na defesa da bola.
NECESSIDADE #3 – Racionalizar o Drible e jogar em Equipa
Proponho-me a explorar duas ideias.
Recordo uma ideia do Prof. Hermínio Barreto sobre o drible e o ensino do jogo, a do drible ser a técnica com mais “transfere” para as outras, passe e lançamento. Ou seja, a de que a melhoria do drible tem impacto não só no drible, mas também no passe e no lançamento. Paradoxalmente, em muitas equipas de Minis proíbe-se os miúdos de driblar e obriga-se a jogar só em passe. Poderemos estar a desperdiçar uma oportunidade de desenvolver algo que é sensível, nessas idades, o manusear e transportar a bola e a criar um problema futuro, os jogadores jovens não saberem transportar a bola. Poder-se-á argumentar que não se proibir o uso do drible os jogadores, estes não irão passar a bola, os outros vão-se aproximar e poderemos estar a criar um problema, o da aglomeração. Poderá acontecer, mas será que a melhor solução para todos, ao longo do tempo é proibir de driblar? Será que não haverá um conceito que promova o uso racional do drible? Para os interessados nesta matéria, sugiro um conceito que aprendi com o Senhor Treinador Lou Carneseca, o conceito dos “3 Olhares”.
Por outro lado, assistimos com alguma frequência a jogos de jovens e até de seniores onde os jogadores com bola passam quase todo o ataque com bola, ou de costas para o cesto ou a jogar “streetball” (sem caráter pejorativo). Para ilustrar esta ideia, vou utilizar uma imagem de um jogador de futebol que é capaz de fintar dez adversários dentro de uma cabine telefónica, mas não consegue encontrar a porta. Ou seja, de que serve, para o jogo e para a equipa, ter um jogador com bola, mais de 15 segundos a driblar, sem sair do sítio? Concordo esta situação poderá ser funcional se, por exemplo, faltarem 15 segundos, a equipa estiver a ganhar por 4 e o “driblador” for o melhor lançador da linha de lance livre. Contudo, não é esta situação que estou a explorar, antes a descrita antecipadamente. Será que os outros quatro jogadores que passam grande parte do tempo sem tocar, quanto mais participar no ataque vão estar muito empenhados na defesa ou que essa equipa revelará grande espírito de equipa ou (…)? Ou seja, há necessidade de eliminar os dribles excessivos e disfuncionais, no mesmo sítio, sem propósito para além do jogador se recriar com a bola. Há necessidade de racionalizar o drible e estimular o jogo de equipa.
NECESSIDADE #3 – Contágio Positivo
Há uns anos, estava com o meu grande amigo e professor, o Coach Bob Hodgson e a “nossa” equipa de verão, a caminho de mais uma série de jogos. Já no aquecimento do primeiro, fiquei pasmado com a diferença das equipas. Num dos lados, uma equipa de jovens altos, atléticos, a afundar a cada passada no aquecimento e do outro a “nossa” equipa de jovens pequenos e lentos. Poder-se-ia pensar que o jogo ia ser desequilibrado e efetivamente começou por sê-lo. Contudo, a determinada altura aconteceu uma coisa curiosa. A pedido do Coach Hodgson um dos jogadores começou a defender todo o campo. A vontade, o entusiasmo, o esforço, a persistência em voltar a recuperar o enquadramento defensivo, quando era ultrapassado foi tal que não só começou a criar imensos problemas ao transporte de bola da equipa adversária, recuperou algumas, que converteu em passadas, como os colegas de equipa começaram a subir a defensa, a sobremarcar as linhas de passe e quando tal estava em campo uma máquina de defesa, que produzia turn-overs, violação do tempo de transição do meio-campo, roubos de bola, contra-ataques euforia nos jogadores e nos adeptos e já agora, a equipa ganhou o jogo O que é que provocou tudo isto? A sabedoria de um Mestre, o Coach Hodgson, e o contágio positivo que a ação de um jogador, no caso a defender a bola, provocou em toda a equipa. Ou seja, o basquetebol necessita de situações que provoquem contágio positivo.
SEGUNDA PARTE – UMA SOLUÇÃO, PARA QUATRO NECESSIDADES
Será que o basquetebol está preparado para introduzir um conceito ou uma regra que poderá ajudar a resolver estes 4 problemas e a criar uma cultura de defesa?
Que conceito poderá provocar esta “avalanche” de benefícios?
Que regra poderá incentivar os jogadores a defenderem a bola sem ajudas, ajudar a tomar melhores decisões, racionalizar o drible / jogarem em equipa e contagiar positivamente?
RESPOSTA: A Regra dos “5 Segundos”
A regra FIBA, segundo confirmei ontem com um comissário, continua a penalizar o ataque com perda de bola, se estiver a ser pressionado e não passar ou driblar em 5 segundos. Que utilidade tem tido esta regra para o jogo, nomeadamente para as equipas defenderem? (…) Tirando uma situação concreta de uma fase final de sub20 (julgo eu), em que uma equipa perdeu um campeonato e outra o venceu, com influência direta desta regra, não estou a recordar outro impacto.
Porém a regra dos “5 Segundos” a propor não é esta, antes aquela que presenciei no Estados Unidos (até 2016): o ataque perde a bola, se o atacante com bola estiver a ser pressionado (1 braço de distância) e não a passar ou lançar em 5 segundos, mesmo que esteja a driblar. Isto é, se o atacante com bola, estiver a ser pressionado, mesmo a driblar e não passar ou lançar em 5 segundos, a sua equipa perde a bola. Isto é um incentivo claro à pressão da bola, ao enquadramento defensivo, à manutenção do enquadramento defensivo, ao defender a bola 5 segundos, aos colegas sobremarcarem, ao contestar o lançamento.
Qual das regras dos 5 Segundos, FIBA ou USA (até 2016), ajuda a resolver os 4 problemas descritos?
A proposta é simples, introduza-se a regra USA dos 5 Segundos, utilizada até 2016, em todos os escalões de formação.
Haverá aqueles que não quererão mudar. A esses pergunta-se:
- Estão satisfeitos com os resultados dos 5 Segundos atuais?
- Esperam resultados diferentes, utilizando as mesmas soluções?
- A diferença que proponho é demasiado diferente ou está em completo, repito completo, desacordo com ela?
- Têm uma proposta diferente? Melhor?
Aos que reconhecem utilidade nesta proposta, partilhem este “post” e pode ser que água mole em pedra dura …
Este é um dos exemplos de como podemos influenciar o jogo e a sua qualidade, mesmo na secretária.
por João Oliveira
19-8-2019
(*) Republicação do texto original, com autorização do autor, publicado a 3-02-2019 em:
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