Thomas Alva Edison é conhecido pela sua
capacidade criativa, nomeadamente a lâmpada incandescente, mas muito menos pelos
seus processos de recrutamento e escolha dos seus colaboradores, para as suas unidades
industriais.
Produziu um inquérito com cerca de 150 perguntas,
que hoje poderíamos denominá-las de “perguntas de algibeira”, tais como: Que
cidade dos Estados Unidos é conhecida por fazer máquinas de lavar roupa? Qual é
o nome de um famoso fabricante de violinos? O que causa as marés? O que provoca
a mudança das estações? Quem descobriu o Pólo Sul?
Consta que mais de 700 candidatos fizeram
o inquérito, somente 57 obtiveram aprovação de 70%, e apenas 32 obtiveram 90%
ou mais.
Este processo de recrutamento com base
nas respostas apelando intensamente ao conhecimento decorado e dependente da memória,
influenciou um jornalista, que numa das visitas de Einstein aos USA, tentou testar
os conhecimentos de uma das personalidades de maior prestígio científico e intelectual,
e perguntou-lhe qual era a velocidade do som?
Consta que Einstein não respondeu objectivamente,
dizendo que essa informação está prontamente disponível em livros e, portando,
seria desnecessário decorar. Aproveitou, no entanto, para esclarecer a sua não
resposta, com uma declaração sobre o tipo de ensino que advogava:
“O
valor da educação universitária não está em aprender muitos factos, mas em
treinar a mente para pensar”
Einstein noutros momentos voltou a fazer
comentários sobre o ensino e consta que tivesse afirmado:
“A
vantagem competitiva de uma sociedade não virá da eficiência com que a escola
ensina a multiplicação e as tabelas periódicas, mas do modo como estimula a
imaginação e a criatividade”
“Comentários
e críticos de estudantes devem ser recebidos amigavelmente”
“A
acumulação de material não deve sufocar a independência do estudante”.
Dois gigantes da história da ciência valorizando
perspectivas do conhecimento substantivamente diferentes: Edison com uma visão
prática, utilitária e imediatista, tentando seleccionar profissionais com
conhecimentos gerais, que no seu entendimento melhor desempenhariam as funções na
sua fábrica, e Einstein com uma visão abrangente, talvez mais visionária,
ambicionando cidadãos intelectualmente disponíveis para pensar, capazes de
raciocinar e de compreender os enigmas da natureza, uma perspectiva da vida
mais romântica.
Por estranho que possa parecer, o futuro
veio de alguma forma reconhecer a visão e romantismo de Einstein, comparativamente
com o pragmatismo de Edison. Se verificarmos hoje, a evolução e o rumo da
transferência da memória biológica para a memória artificial, através de capacidades
infindáveis de armazenamento e tratamento de informação, instantaneamente
acessíveis e disponíveis, tornando secundárias as necessidades de memorização, libertando
a actividade humana para as funções de selecção da extensa informação
disponível.
É importante decorar, sim, quanto baste,
e ter alguma memória de trabalho, mas é mais importante saber pensar e decidir.
Também será prudente não pôr em causa a
necessidade da memória de longo prazo ou histórica, responsável por nos situar
no espaço-tempo, balizar na ética e de nos alicerçar nos valores.
Por certo que ensinar basquetebol não
pode estar fora destas realidades e também precisa de escolhas.
Além dos reconhecidos benefícios, que os
praticantes de uma modalidade desportiva podem obter directamente para si no
plano pessoal e individual, existem também inegáveis reflexos e benefícios para
a sociedade através da actividade desportiva, não só actividade económica, mas também
o exemplo dos seus valores diários, onde a importação de comportamentos e
qualidades desportivas são transitados para a gestão empresarial, cujo exemplo do
“coaching para executivos” é bem representativo. Reconhecer a importância do
desporto na sociedade não é difícil.
Desporto saudável, melhores cidadãos,
melhores sociedades, desportistas competentes, livres e responsáveis, cidadãos esclarecidos,
autónomos, conscientes e de corpo inteiro. Desporto e sociedade uma realidade.
Quando LOU CARNESECA, num curso para
treinadores, me permitiu experimentar como jogador que num campo com uma bola
na mão e alguns companheiros podíamos entender-nos com base em leituras
permanentes, acções e reacções em cadeia, resultantes das posições relativas de
cada um dos vários intervenientes, fossem eles colegas ou adversários, fez-me
sentir realmente noutro mundo. Realizei o sentido de ser jogador. Fez-se
luz, abriu-se horizontes na minha ignorância e na forma como me tinham feito ver
a modalidade até então, interessante, mas incompleta. Sentir outra dimensão de
ser jogador, estar de facto na modalidade e no desporto de uma maneira
diferente.
Terem-me permitido a ousadia da
autonomia, de tomar
decisões em vez de cumprir com sistemas pré decorados, como sempre me tinham
ensinado e obrigado a fazer, foi um prazer que ainda hoje me emociona. Fazer
com qua minha decisão pertencesse a uma cadeia de decisões, como se uma equipa
de um organismo se tratasse, era uma experiência a roçar o fantástico. Confiarem
na minha decisão tornava-me membro, obrigava-me a pertencer e a ser
responsável.
Terem-me dado regras e princípios, que permitiam que a minha decisão individual,
poderia não só ser boa para mim, mas sobretudo para a equipa e para os meus
colegas, fez-me sentir verdadeiramente útil e importante.
Terem-me dado a possibilidade de decidir
de acordo com situação no momento, e não de acordo com um qualquer sistema antecipadamente
decorado e repetido à exaustão, fez-me perceber melhor porque valia a pena
estar nessa realidade, viver esse momento, jogar basquetebol. Era libertador
e inspirador.
Afinal era possível jogar a pensar e a decidir
sem amarras, desde que
responsavelmente.
O problema agora era fazê-lo bem,
competentemente, esse era o objectivo, e não nasceu comigo, nem com ninguém, precisava-se
de treino, de treino e de treinadores competentes neste ambiente, precisava
neste caso de cultura basquetebolística, e isso é ESCOLA.
A forma como o ensino do basquetebol era
baseado, em sistemas decorados e repetitivos era a comum das realidades, e tal
como os inquéritos de Edison, podiam ser práticos e até uteis, mas jogar basquetebol
por conceitos era, e é, outra dimensão.
A dificuldade neste novo processo era conseguir
as aptidões individuais e as regras colectivas para a decisão, que conferissem coesão,
consistência, confianças mútuas e coletivas, próprias da sobrevivência e do sucesso
de um grupo, de qualquer grupo. O que era mais difícil de fazer e de conseguir era,
a par da autonomia e da responsabilidade, fazer acreditar no outro, e isso tinha
riscos pela imprevisibilidade, mas era esse exercício que reforçava a confiança,
confiar no decisor, no treinador, confiar no jogador, confiar no colega de
equipa, não porque decorou, mas porque pensou e decidiu bem de forma continuada
e, acima de tudo, compreender que as regras são boas e necessárias.
Talvez seja este o melhor contributo que
o desporto e esta modalidade o basquetebol possam fornecer para sociedade, ENSINAR A PENSAR, DECIDIR E A VIVER com
regras boas para todos, contribui para equipas organizadas e bons jogadores,
contribui para comunidades de sucesso e para cidadãos plenos de corpo inteiro.
Não são marionetes nas mãos de um treinador, nem de ninguém, e acima de tudo revela
que a arte de educar está em compatibilizar na mesma acção, no mesmo
momento, o interesse individual com o interesse colectivo do grupo e da equipa.
O grande contributo que o basquetebol
pode e deve dar e os
treinadores podem e devem permitir através dos seus processos e dos seus
jogadores, é dar à comunidade gente realizada com o treino, gente feliz
com o jogo, no fundo felizes com a vida.
Aniceto do Carmo
#desporto #basquetebol #basketball #portugal #basquetebolportugues #ensinarajogar #basquetebolporconceitos #estrategia #etica #ideiasparaobasquetebol