Um desporto global e uma marca de referência, a NBA – por António Pereira


O basquetebol afirma-se como um desporto à escala global e tem na NBA uma organização de referência na gestão desportiva, na qual implicitamente incluímos as áreas da comunicação e do marketing da competição e das suas diferentes organizações desportivas (equipas). 

Uma publicação da KPMG do dia 16 de fevereiro evidencia que a NBA é a organização com mais visibilidade/mais seguida nas redes sociais em todo mundo (Facebook, Instagram, Twitter, YouTube, Tik Tok e Weibo).

Para mim, que sou conhecedor da realidade americana e defensor do seu modelo organizacional (estruturas das organizações, modelos competitivos, marca desportiva, marca pessoal dos atletas, relação com os adeptos), os números agora divulgados neste estudo não me surpreendem.

A minha intuição levava-me a crer que esta era a realidade e afirmei por diversas vezes, que a NBA é a organização de referência quanto ao modelo de gestão das organizações desportivas em todas as áreas da gestão.

  

O que é que a NBA faz de diferente das outras organizações desportivas? Onde está o sucesso da NBA?

Na minha opinião, podemos identificar os seguintes fatores diferenciadores:

  • A capacidade de se atualizar e de se ajustar à realidade da indústria desportiva do momento, indo ao encontro daquilo que os adeptos querem ver;
  • A capacidade de comunicar através das diversas plataformas, com conteúdos interessantes e adaptados a cada uma delas;
  • O aproveitamento das novas tecnologias e aquilo que elas podem contribuir para aumentar a produtividade individual dos atletas, a melhoria das equipas e experiência que proporcionam aos adeptos;
  • As competências de cada elemento da equipa que organiza cada evento/jogo, sempre na procura incansável da satisfação dos adeptos, dos atletas e dos diversos stakeholders.

Um bom exemplo da capacidade da NBA se adaptar às circunstâncias, boas ou más, – neste caso, francamente prejudicial para o negócio –, foi a criação de uma bolha em tempo de pandemia, na qual os contactos físicos de todos os intervenientes (onde se incluíam barbeiros e outros profissionais) foram limitados ao mínimo, isto como solução para se concluir a época de 2020. Uma iniciativa que acabou por ser replicada um pouco por todo o mundo, adotando a mesma terminologia, mesmo noutras modalidades.

Mais uma vez a NBA esteve na linha da frente da inovação e da adaptabilidade.

 

Mas será que foi sempre assim?

A verdade é que nem tudo foi um mar de rosas na vida da NBA.

Nos anos 60 e início dos anos 70, as equipas acumulavam prejuízos, os jogadores eram envolvidos em polémicas e escândalos diversos, nomeadamente consumo de droga, álcool e prostituição. Algo tinha de ser feito para salvar a Liga e as suas equipas.

A NBA necessitou de se fundir com a ABA, o que aconteceu em 1976, permitindo que jogadores que brilhavam na ABA, entre os quais, por exemplo, Julius “Dr. J” Erving, George “Iceman” Gervin e Artis Gilmore trouxessem o espetáculo de volta à competição e despertassem o interesse dos adeptos.

Com a escolha no Draft de Larry Bird, pelos Celtics de Boston, e de Earvin “Magic” Johnson, pelos Los Angeles Lakers, a NBA aproveitou a rivalidade que existia entre os dois jogadores, iniciada aquando do seu percurso universitário, à rivalidade entre as duas equipas mais galardoadas da competição, bem como a rivalidade tradicional entre as equipas do Oeste e do Este.

Assentes em modelos de jogo diferentes, os Lakers usavam o “show time”, cujo líder era “Magic” Johnson, para ganhar e atrair para os seus palcos as grandes estrelas de Hollywood. Por seu lado, os Celtics, liderados por Larry “Legend” Bird, assentavam o seu modelo de jogo no coletivo e na coesão do grupo e sob essa fórmula os “5 magníficos” faziam jus à tradição de trabalho dos irlandeses de Boston.

Apoiadas pelos canais de televisão e patrocínios de diferentes empresas e marcas, o basquetebol da NBA cresceu em interesse, popularidade e audiências.

Com Michael Jordan (MJ) a NBA entrou numa nova era. Nenhum outro atleta teve o mesmo impacto numa modalidade desportiva dentro e fora do campo e nos negócios à volta do jogo de basquetebol.

MJ lançou a sua própria marca de sapatilhas e de material desportivo e hoje é essa mesma marca que equipa todas as equipas da NBA e grandes clubes do futebol, para além de ser dono de uma equipa da NBA, os Charlotte Hornets.

Desde o início da sua carreira, Michael Jordan assumiu um compromisso com o basquetebol e com a vitória, indo de encontro ao que o adepto quer – ver bons jogadores, disfrutar de bons jogos e ver a sua equipa a vencer – desafiando todos os outros jogadores na procura da excelência.

A NBA estava a começar a percorrer um caminho para chegar à visão do que queria alcançar, traduzidos em muitos dos slogans que foram sendo usados ao longo dos anos. “I love this game”; “A Global Game”; “This is why we play”; “Where the amazing happens”; “Whole new game”; “Showtime”; “Sometimes is more than a game”; “NBA Cares” … foram sendo a face visível de uma comunicação estratégica e direcionada para os diversos alvos.

O “Dream Team” que participou nos Jogos Olímpicos de Barcelona incluía os melhores jogadores da NBA e foi decisivo na globalização definitiva do basquetebol e da NBA, permitindo que os atletas da NBA deixassem de ocupar o patamar de comuns terrestes para passarem a serem vistos como atletas de outra dimensão, afirmando-os como embaixadores de marcas empresariais e passando mesmo a ser vistos como marcas pessoais. A NBA e o seu basquetebol passaram definitivamente a ser uma marca global, alcançada por milhões de pessoas em todo o mundo e onde o comum mortal é capaz de identificar os seus atletas, os novos ídolos do desporto global e as equipas.

No início da sua carreira, Kobe Bryant coincidiu na NBA com MJ, chegando ambos a travar “batalhas” intensas no campo de jogo. Kobe sempre se assumiu como um copiador de Jordan. Com a sua retirada, Jordan passou o seu legado a Kobe, que continuou a brilhar e a afirmar-se como o novo embaixador da NBA, tornando-se um modelo de referência e ícone da NBA e do basquetebol ao nível global, para o qual contribuiu a disseminação da internet e das redes sociais.

A popularidade a NBA atraiu os melhores jogadores de todo o mundo e os melhores atletas passaram a ambicionar jogar na melhor competição do mundo: a NBA.

O número de jogadores estrangeiros na NBA vai aumentando e o seu impacto no jogo também. A sua importância na promoção da NBA é relevante, porque ajuda a promover o basquetebol e a NBA nos seus países e continentes de origem.

Pela NBA já passaram atletas de mais de cem nacionalidades, de todos os continentes e no ALL STAR GAME de Cleveland, em 2022, vão participar 15 jogadores provenientes de 12 países.

O recrutamento de jogadores da NBA e das suas organizações já não pode estar dependente da produção de jogadores vindos das competições universitárias americanas. O seu raio de recrutamento estendeu-se a uma escala planetária e ela própria desenvolve talentos, como é o caso da equipa da NBA G League Ignite, equipa que é composta por jogadores com imenso potencial e que por convite optam por não entrar numa universidade, disponibilizando-se para aprender num ambiente profissionalizado, para além de academias em diversas zonas geográficas do mundo com especial incidência na Ásia, África e o programa NBA Jr.

Por outro lado, o negócio da NBA vai de vento em popa, como se costuma dizer. A valorização das equipas da NBA (as equipas estão avaliadas entre 1,5 biliões de $US a 5,8 biliões de $US) e da WNBA (1 bilião de $US) e o aumento do número de equipas da NBA G League reflete uma visão globalizada e sustentável do modelo de negócio.

A competição feminina vai ao encontro da igualdade de género, dando voz e imagem às mulheres. A G-League nasce pela necessidade de desenvolvimento de jogadores como forma de alimentar em talentos a exigente competição que é a NBA. O sonho americano está presente é preciso dar oportunidade a todos de poderem um dia jogar na melhor competição.

A estrutura das equipas é quase sempre uniforme. Um presidente, um diretor desportivo, uma pessoa ligada à gestão do dia-a-dia, o corpo técnico, os atletas e o departamento médico. Como em qualquer organização, o departamento de marketing, comunicação, recursos humanos, financeiros e outros fazem parte da estrutura organizacional. Muitas das funções ligadas à gestão da equipa são realizadas quase sempre por pessoas com experiência no basquetebol.

Nestes últimos cinquenta anos, o papel dos diversos comissários da NBA reflete a sua capacidade de adaptabilidade, visão e implementação de uma estratégia. Todos alcançaram bons resultados, dados estes mensuráveis.

Larry O’Brien (comissário de 1975-1984) recuperou a NBA de uma situação de falência e de uma má imagem e reputação, através da fusão da NBA e ABA, negociando diversos contratos de televisão e introduzindo a política do teto salarial.

David Stern (19884-2014) globalizou a NBA e tornou-a numa competição que todos querem seguir e ver, promovendo jogos noutros países e recrutando jogadores internacionais. Abriu escritórios em diversos países como forma de criar relações nessas áreas geográficas e levou os jogos a mais de duzentos países. Criou a WNBA, a NBA G League, a presença digital da NBA (NBA TV, NBA League Pass) e programas ligados à responsabilidade social (NBA Cares).

David Silver (2014-até ao momento) tem um passado na NBA, desempenhando diversas funções, o que o levou a ter um amplo conhecimento da organização. Sob a sua liderança, a NBA continua a crescer do ponto de vista financeiro (entrada de fundos como proprietários de uma % do valor da equipa) e de interesse no mundo (investimento na relação com os adeptos pela via do digital), com especial destaque na China. Silver incentiva ainda os atletas a ter uma voz ativa na comunidade e de se envolverem na resolução de problemas sociais nos Estados Unidos da América.

 

Conclusão

Onde está, então, o sucesso da NBA?

Porque é que qualquer cidadão comum, de qualquer país do planeta, identifica os principais jogadores da NBA e o nome das suas equipas?

Porque é que os jovens seguem a NBA de forma tão ávida?

Parece-me que a resposta é simples.

A NBA assume-se como uma marca que tem como principal propósito o espetáculo e entretenimento dos adeptos e muitas das suas organizações são geridas como organizações de conteúdos.

Através do basquetebol, e inserida no mercado da indústria desportiva, a NBA gere diversos tipos de conteúdos e para isso é necessária uma visão sobre onde quer estar no futuro, conhecer os seus adeptos, independentemente de onde estão e a que grupo etário pertencem, gerar interesse e ser relevante, o que lhe é permitido verificar através da análise de dados, a definição de objetivos e etapas.

A marca NBA entende qual é o seu negócio, qual é o seu propósito enquanto marca e tem a consciência da importância de comunicar e ouvir os adeptos.

E isto é expresso numa cultura organizacional de excelência, comprometida com resultados, na valorização financeira das suas equipas, na evolução dos salários dos atletas e no interesse na aquisição de equipas por parte de privados ou de fundos de investimento e crescimento dos seus seguidores/adeptos.

Para a NBA, o importante é construir relações, independentemente das diferenças, porque dessas diferenças podem nascer novas ideias e trazer inovação. E independentemente do local e da forma como cada um quer participar, as pessoas estão unidas na linguagem do desporto e pelo amor ao basquetebol.

Assim sendo, independentemente de quem é o promotor do espetáculo desportivo este deve ter a ambição e o desejo de que as pessoas se desloquem ao pavilhão pela qualidade do espetáculo e entretenimento que oferece e não por artefactos artificiais que apenas terão a intenção de encapotar o problema real: incapacidade de atrair adeptos pela falta de qualidade do produto/espetáculo desportivo.

 

por António Pereira

20/02/2022








António Pereira, é um ex-jogador e ex-treinador de basquetebol, tendo desenvolvido a função de scouting durante vários anos. É licenciado em Comunicação Organizacional com as especialidades de Comunicação de Marketing e Comunicação de Relações Públicas, Mestre em Marketing e Comunicação e escreve sobre Gestão do Desporto, Marketing e Comunicação do Desporto no blog https://apbasketball.blogspot.com/ e https://ideiasparaobasquetebol.blogspot.com/ entre outros.

 

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