Basquetebol - Perspetivar o futuro e os projetos de formação – por António Pereira


Foi com enorme satisfação, que li a entrevista de Tomaz Morais, diretor do futebol de formação do Sporting, ao jornal Record, edição de sábado, 18 de setembro, na qual fez uma reflexão sobre a Academia Cristiano Ronaldo e perspetivou a atividade desenvolvida.

Com o título em destaque “TEMOS DE OLHAR PARA O QUE VAI SER O FUTEBOL DAQUI A 10 ANOS”, Tomaz Morais abordou o modelo de desenvolvimento do jogador de futebol. Parte da trilogia de ideias - jogador, família e escola, como propósito do trabalho diário – e baseia-se numa visão clara do que se pretende – “formar jogadores que cheguem à equipa A (equipa principal do Sporting)” –, apoiando-se em pessoas habilitadas e conhecedoras do mercado, bem como em pessoas mais experientes (Aurélio Pereira - olheiro/scouting). Além disso, o treinador da equipa sénior também está envolvido – “o mister Ruben tem tentado a todos os momentos recolher informação e ajudar”.

Este processo é desenvolvido de forma fluida através da implementação de um plano estratégico, em que todos os profissionais estão envolvidos e obedecem às mesmas ideias – “conjugação total do futebol entre o futebol do Sporting”. Esta é a base de um trabalho que reflete uma imagem atrativa e que, assim, “ajuda a recrutar”, propondo um sentido de valorização ao atleta.

Não posso deixar de expressar a minha empatia pelo que é referido como base do sucesso.

Eu próprio tenho escrito (Pereira, 2016a, 2016c, 2021e, 2021a, 2021b, 2016b, 2019b, 2019a, 2019c, 2020b, 2020a, 2021d, 2021c) sobre a necessidade de se formar jogadores do futuro, querendo com isto dizer, que devemos formar jogadores preparando-os com competências técnicas, conhecimento do jogo, capacidade físicas e estrutura mental, que lhes permita ter sucesso quando chegarem ao escalão sénior, seja isso daqui a seis, oito ou dez anos. Naturalmente, sem descurar os conteúdos (competências/skills) que na fase inicial da formação lhes permita crescer e competir no presente, mas possibilitem a melhoria ao longo do seu percurso de formação.

A este propósito, foi interessante ler uma publicação de LeBron James na rede social Twitter feita a 18 de setembro de 2021, colocando a questão: “Why do so many ball players work on stuff they are never going to use in the game?? Seriously question. Annoys me a tad”. O que traduzido pode ser lido da seguinte maneira “Por que razão tantos jogadores trabalham em coisas que nunca vão usar no jogo?? Pergunta séria. Irrita-me um pouco”.

Ora, para se fazer uma formação de qualidade é preciso termos treinadores que dominem os fundamentos do jogo e a forma como os ensinam. Esta responsabilidade cabe à Federação Portuguesa de basquetebol (FPB), à Escola Nacional de Basquetebol e, porque não, à Associação Nacional de Treinadores de Basquetebol (ANTB). Depois de uma fase em que foi preciso formar pessoas, deve-se, na minha opinião, passar à fase seguinte, que é a de formar treinadores com a qualidade necessária e medindo resultados sistematicamente.

Tudo isto deve fazer parte de um plano estratégico de gestão desportiva, mais alargado, onde deve ser definida uma visão do que se pretende atingir e o propósito que dá significado à vida de cada clube/treinadores/dirigentes, enquanto dedicados à formação de homens pelo desporto.

A necessidade de desenvolver jogadores ou formar jogadores sempre esteve na génese de diversos clubes de basquetebol. Nos anos 70 e 80, era possível identificar vários clubes espalhados um pouco pelo país como bons exemplos de clubes formadores e que muito deram ao basquetebol.

Tive a oportunidade de pertencer a um desses grupos, em Coimbra, onde durante a década de 70 foram obtidos excelentes resultados. Fruto desse trabalho, foi possível identificar um pouco mais do que 40 jogadores que tinham passado pela Académica e pelo Clube Académico de Coimbra (CAC) e que no fim dessa década e início da década de 80 estavam a jogar na 1ª divisão (1º nível competitivo de então), o que permite pensar que o trabalho teve qualidade e nos enche de orgulho ter pertencido a tal programa.

Nessa altura, todos queríamos chegar à equipa sénior e sentíamos que a estrutura estava envolvida para alimentar esse desejo. O treinador sénior era ao mesmo tempo treinador dos sub14 e o trabalho de formação era coordenado e apoiado pelos treinadores mais conhecedores. Para além de se formarem homens, também se competia, o que se traduziu na conquista de 3 títulos de campeão nacional de juvenis, 2 títulos de campeão nacional de júnior, a equipa sénior masculina foi campeã da 3ª e 2ª divisão e a equipa sénior feminina foi campeã nacional da 2º e 1º divisão e diversos jogadores/as tiveram a honra de representar a seleção nacional.

Mas, o mais importante, foi a forma como os líderes do programa contribuíram para a formação individual de cada um, através do enraizamento de uma cultura de exigência, de compromisso, de paixão e de dedicação ao basquetebol, o que nos permitiu crescer e nos preparar para ter sucesso na vida profissional e familiar.

Dantes, dizia-se que os treinadores eram medidos de duas formas. Os da formação “pela quantidade de jogadores que faziam chegar à equipa sénior” e os da competição “pelos títulos alcançados”. Esta foi a base de uma cultura organizacional no desporto, que unia as pessoas com paixão do basquetebol e que resultou no aparecimento de muitos atletas de eleição, alguns deles ainda muito jovens (com a idade de sub18) a jogarem em equipas seniores.

É com alguma tristeza que hoje, identificamos que poucos são os jovens jogadores que desejam chegar à equipa sénior, sendo que, por outro lado, parece-me que o objetivo do treino e jogo é o de proporcionar momentos de prazer e satisfação e não de competição, o que faz com que os jovens jogadores não cresçam através da competição, quer do ponto de vista pessoal, quer do ponto de vista desportivo. Por alguma razão, Tomaz Morais disse “o importante é competir como Ronaldo compete” como forma de os jogadores crescerem.

Tendo consciência plena que a cultura organizacional é fundamental, para o sucesso e crescimento de uma organização, demonstrando de forma inequívoca como algo deve ser feito, e tendo em consideração que o período pandémico deixou marcas no crescimento e desenvolvimento dos praticantes, pergunto: será que com a atual cultura organizacional conseguiremos vir a ter uma formação de excelência com base na trilogia – formar homens de sucesso através do desporto e preparados para a vida (inteligência emocional); competências académicas (hard skills); e valores e atitudes?

 

Bibliografia:

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por António Pereira

21-09-2021

 






António Pereira é um ex-jogador e ex-treinador de basquetebol, tendo desenvolvido a função de scouting durante vários anos. É licenciado em Comunicação Organizacional com as especialidades de Comunicação de Marketing e Comunicação de Relações Públicas, Mestre em Marketing e Comunicação e escreve sobre Gestão do Desporto, Marketing e Comunicação do Desporto no blog https://apbasketball.blogspot.com/, no jornal A Bola on-line entre outros.

 

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